São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 1994
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Carnavalesco exalta a loucura na Viradouro

LUIZ CARLOS DUARTE
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Depois de exaltar o luxo e o lixo, em dois momentos marcantes da história recente do Carnaval do Rio e Janeiro, o carnavalesco Joãosinho Trinta, 60, volta ao Sambódromo este ano para fazer, desta vez, a elegia da loucura.
Ausente do desfile do ano passado, por conta de uma viagem a Portugal e pelo projeto Flor da Manhã –uma programa de oficinas carnavalescas organizadas para atender crianças carentes, Joãosinho reaparece à frente da Unidos do Viradouro, a escola ver
melha e branca de Niterói, com o enredo "Tereza de Benguela – Uma Rainha Negra no Pantanal".
Todo o desfile gira sobre a loucura que horrorizou a líder escrava ao ver o seu quilombo do Quariterê destruído pelas forças dominantes no Brasil colonial. A associação do enredo com o atual estágio da sociedade brasileira é particamente inevitável.
"Estamos em um período de trevas, sob uma imensa nuvem de malignidade e ganância. Todo o povo brasileiro está vendo. E Dalai Lama disse isso para mim", diz Joãosinho, relembrando a conversa que teve com o líder religioso do Tibete durante a Eco-9
2, no Rio de Janeiro.
O projeto de civilização brasileira, segundo ele, está sendo destruído por intermináveis calamidades. "É uma sucessão sem fim. Ibsens e Fiuzas são os Pizarros deste final de milênio. No Brasil de hoje só interessa o valor físico das coisas. A preo
cupação civilizatória não faz parte do cotidiano das pessoas", acrescenta.
As várias formas da loucura, que Joãosinho pretende mostrar durante a passagem da escola, vão se concentrar na parte final do desfile. São figuras grotescas, demônios e máscaras, reunidas nas alas que encerram a apresentação.
"Tudo é muito doido. Somos um país que tem muitas máscaras", antecipa Joãosinho. O carnavalesco já foi campeão sete vezes na passarela.
O ponto de reversão para tempos melhores, afirma –"onde a serpente morde o rabo", virá da revolta dos destituídos, com a força da maldição da guerreira Tereza de Benguela.
O final apoteótico do desfile da Viradouro prevê a figura de Tereza ladeada por representações de Montezuma, o rei asteca, e Ataualpa, o rei inca, que também viram seus impérios serem completamente destruídos pelos brancos.
O enredo valoriza as maldições que ambos lançaram sobre as nações imperialistas. A ala da cocaína irá simbolizar uma das maldições imprecadas aos colonizadores.
Visionário, Joãosinho quer que Tereza "encarne" em alguma mulher que mude os rumos do Brasil. "Os homens já estragaram o país", afirma.

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