São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 1994 |
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Camarões ainda está sem time-base
MARCELO DAMATO
A própria presença de Michel é um sinal do desespero da federação de Camarões. Michel, hoje proprietário de uma empresa de seguros e investimentos, estava afastados dos campos desde 1991, quando deixou o comando do Paris Saint-Germain. Como técnico, Michel levou a França ao título olímpico em 1984, derrotando o Brasil na final, e ao terceiro lugar na Copa do Mundo de 1986, depois de eliminar os brasileiros nas quartas-de-final, nos pênaltis. Morando em Yaoundé (capital de Camarões) apenas desde o dia 30, Michel trabalha com auxiliares locais e não pretende usar qualquer apoio das novidades da ciência esportiva no seu trabalho. Leia, a seguir, os melhores momentos da entrevista que o técnico de Camarões deu à Folha, por telefone. * Folha - Até onde Camarões pode chegar na Copa? Henri Michel - Nosso objetivo é conseguir nos classificarmos para as oitavas-de-final. Até porque nosso grupo, formado por Brasil, Rússia e Suécia, é muito difícil. É seguramente um dos mais difíceis desta Copa. Folha - E depois? Michel - Depois, todos os jogos vão ser eliminatórios, em que tudo pode acontecer. Folha - O que você conhece de seus três adversários na primeira fase? Michel - Quase nada. A Suécia, eu vi jogar nos Parque (dos Príncipes, em Paris). Da Rússia e do Brasil, eu não vi nenhum jogo. Vou ter que arrumar uns VTs dos últimos jogos dessas seleções e, se der, vou assistir aos jogos deles este ano. É normal, porque eu não esperava que fosse trabalhar nesta Copa. Folha - Como surgiu o convite para você trabalhar em Camarões? Michel - Foi tudo muito rápido. O convite da federação de Camarões veio no começo de janeiro deste ano. Fechamos o contrato em poucos dias, no dia 10 daquele mês. Folha - Por que você aceitou o cargo? Michel - Por amor ao futebol. Dirigir uma equipe na Copa é sempre gratificante, mesmo com tantas dificuldades e com pouco tempo para trabalhar. Se não fosse para jogar uma Copa, dificilmente eu aceitaria. Folha - Em que time você estava trabalhando antes de assumir o novo cargo? Michel - Em time nenhum. Em 1991, eu larguei a profissão e montei uma corretora de seguros e investimentos. Até o final da Copa, minha empresa vai ser tocada pelos meus funcionários. Folha - Como está a seleção de Camarões? Henri Michel - A preparação está começando agora. Assumi o cargo no dia 10, mas só vim em definitivo para cá no dia 30. Folha - Qual é seu o programa de preparação para a Copa? Michel - Há três semanas, começamos uma fase de treinamentos com os jogadores locais. Nessa fase vou observar os jogadores e definir quem tem condições de ficar no grupo. Daqui a alguns meses, vamos chamar os jogadores que estão no exterior e aí definirei quem serão os 22 que irão à Copa. Folha - Já existem amistosos agendados? Michel - Vamos jogar em março contra o Egito. Em abril, faremos um amistoso e, em maio, dois, mas os adversários ainda não estão definidos. Vamos ter quer procurar adversários. Folha - Você pretende mudar a maneira de Camarões jogar? Michel - Não, o futebol de Camarões tem uma cultura que quero respeitar. Só pretendo aumentar a disciplina dos jogadores. Folha - Que tipo de disciplina? Michel - Disciplina tática. Os jogadores precisam se convencer de que cada um deve cumprir sua função em campo. Eles não podem continuar a pensar que só precisam jogar só quando têm a bola. Sem isso, a equipe não irá longe. Folha - Você quer um time que dê espetáculo ou uma equipe guerreira, que só jogue pelo resultado? Michel - Gosto de futebol-espetáculo que seja eficiente. Como a tradição de Camarões é de futebol técnico, sempre procurando o gol, não terei problemas. Como em quase toda a África, os camaroneses são melhores atacantes do que marcadores. Folha - Os "leões" continuarão indomáveis? Michel - Espero que sim (rindo). O futebol de Camarões tem muita técnica. Folha - A seleção atual de Camarões é melhor ou pior do que aquela de 1990? Michel - Alguns dos jogadores daquele time largaram o futebol, outros estão em má fase e não há muitas revelações para substituí-los. Vou aproveitar a primeira fase de treinos, com os jogadores locais, para tentar descobrir algum jogador novo. Folha - Você já tem um time-base na cabeça? Michel - Não. Estou começando a fazer observações agora. É prematuro fazer qualquer declaração sobre como a equipe vai ser montada. Folha - Você pretende chamar Roger Milla, o astro de camarões na Copa de 90, hoje com 41 anos? Michel - Não sei. Ele estava longe dos gramados e voltou a jogar esta semana (dia 30 de janeiro). Hoje, está sem preparo físico. Vou esperar um pouco para ver como ele se sai. Folha - Em 1990, Milla não ia ser convocado, mas foi incluído na seleção por um decreto do presidente do país, Paul Biya. Você aceitaria uma interferência dessas? Michel - Não. Nem sequer aceitaria uma coisa parecida. Sou o responsável pela equipe e portanto tomo todas as decisões. O meu contrato com a federação é bem claro neste ponto. Se o presidente fizer isso, eu aceito o decreto –ou não– e volto para casa na hora. Folha - Qual é a sua opinião sobre o goleiro William Andem, que está no Cruzeiro (é reserva de Dida, ex-Vitória)? Michel - Nunca o vi jogar, mas meus auxiliares dizem que elé é impressionante. Folha - Como está a disputa entre os principais jogadores da seleção? (Kana-Biyik e Omam-Biyik se opõem à convocação dos atletas mais velhos como Milla e o goleiro N'Konno) Michel - A paz ainda não está feita. Vamos precisar tomar uma posição firme. Não se pode deixar que conflitos de interesses pessoais prejudiquem a seleção. Folha - Você trouxe algum colaborador francês? Michel - Meus dois auxiliares, Jules Nyogha e Manga Oguené, são de Camarões. Além deles, não tenho mais ninguém. Folha - Você pensa em importar aparelhos e tecnologia para ajudar na preparação? Michel - Não. Meus maiores problemas estão dentro de campo, mesmo. 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