São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 1994
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Desemprego até quando?

O desempenho recente da economia brasileira sugere que o país começa a inserir-se num movimento mais amplo que se vem verificando nos mais diversos cantos do mundo e que aponta para um horizonte global obscurecido pelas inquietantes nuvens do desemprego. É um movimento que parece de fato extrapolar os ciclos individuais de cada nação, como se fora uma mudança de fase, estrutural portanto, da própria economia mundial.
No Brasil, por exemplo, embora o ano passado tenha registrado um sensível aumento da produção industrial, o total de postos de trabalho não apenas não aumentou proporcionalmente como chegou mesmo a cair. Nos últimos 12 meses, de acordo com a Fiesp, mais de 13 mil trabalhadores foram demitidos em São Paulo, enquanto a atividade industrial do Estado saltava impressionantes 11,7% em 1993. O primeiro gráfico, com números do IBGE, ilustra bem essa tendência.
Os dados internacionais sem dúvida variam, mas o cenário que compõem para o emprego indicam uma tendência tão geral quanto preocupante. Na Alemanha, por exemplo, mais de 4 milhões de pessoas estão sem trabalho, recorde do pós-guerra que tem trazido frequentes paralelos com a massa de desempregados que levou o famigerado Hitler ao poder. Na Espanha, quase um quarto da força de trabalho (23,5%) está desocupada.
Embora com taxas menores, também em outros países, da França aos Estados Unidos ao Japão, a questão do emprego foi alçada ao topo da lista de prioridades. Os dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) prevêem, como mostra o segundo gráfico, que no conjunto dos seus membros –o seleto clube dos 24 países mais ricos– o desemprego alcançará níveis recordes neste ano e no próximo.
Ao mesmo tempo, especialistas alertam que as transformações afetando o mercado de trabalho no mundo atual são de uma tal profundidade que não comportam soluções simples, nem rápidas. Desde as sucessivas ondas de inovações tecnológicas até a revolução nas formas de gestão empresarial, passando pelo acirramento da competição em âmbito global, são tantas as mudanças que seus impactos decerto exigirão tempo para serem todos aquilatados. Uma coisa porém fica clara desde já: a tendência é a de uma sempre maior produtividade, o que no fim das contas significa produzir mais com menos trabalhadores. Isso implica, e é o que já se verifica na prática, que novos ciclos de expansão econômica poderão não mais ser capazes de absorver todos os desempregados da recessão anterior, criando uma formidável bola de neve de consequências imprevisíveis.
Apesar da retomada do crescimento nos EUA, de fato, grandes corporações continuam a promover demissões em larga escala, como nos últimos anos. A gigante AT&T, por exemplo, maior empresa de telefonia do mundo, acaba de anunciar cortes de pelo menos 14 mil funcionários para os próximos dois anos. O profundo processo de reestruturação interna por que passaram as empresas, não apenas as norte-americanas, sugere que o volume de funcionários anterior dificilmente será retomado. Somando-se a essa massa de novos desocupados aquela leva que todos os anos busca integrar-se ao mercado de trabalho, tem-se a magnitude das dificuldades à frente.
O Brasil, porém, parece ainda não se dar conta da dimensão do terremoto que abala os alicerces da economia mundial. Ao contrário do que ocorre lá fora, a percepção parece ser ainda a de que o problema é meramente conjuntural. Numa pesquisa da Fiesp/Ciesp sobre o tema realizada entre empresários, por exemplo, 81,25% das respostas apontaram a retração do consumo interno como o principal fator a motivar as demissões do ano passado. Os dados, porém, como visto acima, sugerem que o Brasil está muito mais mergulhado na crise mundial do emprego do que parecem crer os brasileiros.
A pergunta que se coloca então, aqui como no restante do mundo, é aquela destacada na reportagem de capa da revista "Time" do dia 7 deste mês: os empregos jamais voltarão? Há quem diga, como a revista "The Economist" num editorial de maio do ano passado, que sim, que o saldo da criação e da destruição de tipos de postos de trabalho causadas pelas revoluções tecnológicas tem sido historicamente positivo. Os dados porém, infelizmente, não parecem recomendar tanto otimismo.

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