São Paulo, terça-feira, 15 de fevereiro de 1994
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O folião Itamar

CLÓVIS ROSSI

RIO DE JANEIRO - No meio da tarde de ontem, estava armada a tradicional cena de jornalismo explícito que acompanha cada deslocamento do presidente da República, por mais irrelevante que seja. Repórteres, fotógrafos e cameramen sitiavam, literalmente, a porta do elevador do Hotel Glória, do qual deveria sair o presidente Itamar Franco.
Não que o presidente tivesse algum pronunciamento a fazer. O tititi era bem outro. Itamar Franco resolvera portar-se como um folião comum, na madrugada de domingo para segunda-feira, namoricando uma modelo e fazendo charme para outras mulheres que passaram pelo seu camarote no Sambódromo.
Não chega a ser comparável aos sucessivos escândalos no gabinete do britânico John Major, mas, para uma segunda-feira de Carnaval, era um grande assunto. Mas não um escândalo, convenhamos. O senador Mario Covas, que também se hospedou no Glória, convidado pela Mangueira para os desfiles, desceu do elevador justo na hora em que os jornalistas esperavam o presidente. Claro que acabou perguntado sobre o, digamos, affair Itamar.
"Suponho que o convite para que o presidente viesse ao Rio não incluía ressalvas como a de que pode ver, mas não pode tocar", ironizou Covas, imbuído de espírito carnavalesco.
Ou, como preferia o porta-voz Francisco Baker: "O presidente é solteiro e desimpedido". Uma boa parcela dos homens solteiros e desimpedidos (e até dos casados, admitamos) aproveita o Carnaval (e outras ocasiões) para fazer o que Itamar fez na madrugada no Sambódromo.
Qual o escândalo, então, em descobrir-se, de repente, que o presidente tem lá seus momentos de cidadão comum? Relar as mãos nas pernas de uma modelo não consta entre os motivos para o impeachment do presidente da República. Nem chega a macular a falada dignidade do cargo.
O problema de Itamar não é o de comportar-se às vezes como cidadão comum. É exatamente o de não comportar-se sempre como presidente da República.

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