São Paulo, terça-feira, 22 de fevereiro de 1994
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Quem ganha com a anistia no crédito rural

SYLVIO LAZZARINI NETO

O projeto de decreto legislativo 383, que pretende suspender a correção monetária sobre operações de crédito rural, desde 79 foi aprovado na Câmara dos Deputados e está sendo encaminhado ao Senado, para iniciar sua tramitação nessa casa.
Não importa, neste momento, discutir o volume dos recursos que seria dispendido pelo governo e pelo Banco do Brasil para atender ao decreto. Importa verificar com mais profundidade, que interesses escusos estão por trás desse projeto.
Comete-se, no mínimo, uma desonestidade intelectual, quando se argumenta que a agropecuária brasileira está destruída (fato que serviria de justificação à anistia).
Isso não é verdade. A pecuária, por exemplo, apesar de todos os percalços sofridos nos últimos anos (contingenciamento de exportações, cortes do crédito rural, importações subsidiadas, confiscos etc) tem crescido e a melhor prova de sua evolução está no aumento substancial de seus índices de produtividade.
Em 1979, por exemplo, a taxa de desfrute do nosso rebanho era entre 12% e 13%. Hoje está entre 16% e 18%.
Não foi com recursos do crédito rural que os pecuaristas brasileiros conseguiram essa façanha. Aliás, a partir do início da década de 80, o governo cortou, literalmente, todas as linhas do crédito rural destinadas à pecuária. Apenas em 1988 e 1989 foram liberadas algumas linhas especiais para financiar confinamentos de bovinos, a juro de 18% mais correção, e consta que poucos confinadores deixaram de honrar seus empréstimos.
Sustentar, portanto, que a medida vai fortalecer e resgatar a saúde do setor é uma grossa mentira.
Mais do que um equívoco de avaliação econômica há aí um desvio de natureza ética. Por ser o Banco do Brasil um repassador de recursos da caderneta de poupança verde para o setor rural, que é remunerada com juros e correção monetária, como aceitar que o tomador final seja beneficiado por esse absurdo subsídio?
Como iremos argumentar perante os concorrentes e parceiros internacionais (no caso do Mercosul), nós que temos manifestado com veemência contra o protecionismo, que não subsidiamos nossa agricultura e, por isso, queremos reciprocidade de tratamento?
O fato é que esses mesmos deputados, da bancada ruralista, estão prestando um grande desserviço ao setor, na medida em que o lança contra a opinião pública, que não aceitará calada essa tentativa de se praticar um assalto aos cofres públicos, em proveito de poucos.
A luta pela redução dos impostos indiretos, certamente, não traz bons dividendos políticos e, por isso, é relegada a segundo plano, quando, nesse caso sim, poderá trazer reais benefícios aos agropecuaristas e aos consumidores de alimentos populares.

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