São Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Imprensa americana desconhece o futebol

UBIRATAN BRASIL
DA REPORTAGEM LOCAL

A cobertura do futebol nos Estados Unidos vive um impasse. Conhecendo as regras básicas do esporte, os jornalistas ainda não sabem como aplicá-las. Falta-lhes conhecer a essência do futebol: tática. "O aprendizado do futebol deve ser geral por aqui", disse à Folha o técnico da seleção dos Estados Unidos, o sérvio Bora Milutinovic, com a experiência de quem dirigiu o México na Copa de 86 e a Costa Rica, no Mundial de 90, na Itália.
Milutinovic sabe que carrega um pesado fardo. Com a possibilidade de o time norte-americano nem passar para a segunda fase da Copa (disputará com Suíça, Colômbia e Romênia), a situação comprometeria a liga profissional, que iniciará suas atividades em 95. E, como americano não gosta de disputar nada para perder, dando as costas a um esporte que não lhe renda resultados razoáveis, o investimento financeiro poderá definhar, encerrado o Mundial. É o que explica o tímido espaço ainda dedicado pelos jornais. "Estamos em fase de testes. A audiência é que vai nos motivar ou não", disse Greg Cote, do "The Miami Herald".
Reunidos em grupo, os jornalistas norte-americanos tentaram desvendar os mistérios das equipes, no Joe Robbie Cup, minitorneio disputado por Colômbia, Bolívia, Suécia e Estados Unidos, na semana passada, em Miami. A atenção privilegiava os times latinos, prejudicados pelas ausências dos principais craques, mas únicos capazes de surpreender graças a uma certa dose de talento individual.
O time da Colômbia, por exemplo, encantou os americanos. Apesar do desfalque de Rincón, Valência, Asprilla e, durante o torneio, de Valderrama (simplesmente o principal sustentáculo tático da equipe), o técnico Francisco Maturana procurou manter a estrutura básica que criou ao longo dos anos, embora com peças bem menos dotadas. Mesmo assim, na medida do possível, os meias desciam em bloco, tanto pelo meio, como nas pontas, conseguindo confundir a defesa adversária. A rapidez das jogadas, aliás, só era desvendada pelos atônitos americanos na repetição do lance pelos monitores de televisão, espalhados na sala de imprensa. Em alguns jogos, como a briga latina de Colômbia e Bolívia, marcada pelas jogadas rápidas, a consulta era constante.
A consciência de sua limitação, porém, era clara. O "The Miami Herald", principal jornal da região, dedicou apenas meia página diária ao futebol. E o curto espaço era ocupado principalmente por perfis, em especial dos colombianos –uma jogada de marketing porque o estádio só conseguia uma razoável lotação graças à presença maciça dos moradores colombianos de Miami, consumidores em potencial das matérias. O desinteresse da mídia foi grande. Apenas uma emissora de televisão a cabo transmitiu as partidas, em língua inglesa e sempre em videotape. A correspondente do "The Los Angeles Times" não escondia sua decepção com seu editor: querendo passar os dados finais do torneio, vencido pela Colômbia, pelo telefone, foi interrompida pelo superior, que não sabia o que ela fazia naquele momento no Joe Robbie Stadium. "Não, não estou cobrindo beisebol, mas um torneio de futebol", disse, desanimada, provocando gargalhadas dos colegas.

Texto Anterior: Liga Masculina pode definir semifinalistas
Próximo Texto: Pelé quer saída de João Havelange da presidência
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.