São Paulo, sábado, 26 de fevereiro de 1994
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Pierre Cardin chega para mostrar 40 anos de moda

EVA JOORY
DA REPORTAGEM LOCAL

Pierre Cardin chega para mostrar 40 anos de moda
Pierre Cardin, 72, chega a São Paulo no próximo dia 7. E com a agenda cheia. Uma exposição, "Pierre Cardin - Passado, Presente e Futuro", relembra seus 40 anos de moda; em seguida, lança no país seu primeiro livro, uma obra infantil ganhadora do prêmio Saint-Exupéry, "O Conto do Bicho de Seda" (leia abaixo). É a mesma retrospectiva que ocupou o museu Victoria and Albert, em Londres. No dia 8, apresenta a sua última coleção de alta-costura mostrada em janeiro em Paris, nas escadarias do prédio da FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado), no Pacaembu: faz uma palestra para os alunos da faculdade e checa vendagem e qualidade de sua marca no Brasil, instalada no país desde 1968. Depois, vai ao Rio lançar seu novo perfume e linha de produtos de beleza, "Enigme", e no dia 9 volta a Paris.
Esta não é a primeira vez que o estilista nascido na Itália, de pais franceses, visita o Brasil. A primeira foi em 1967, quando apresentou sua coleção de alta-costura na abertura da 10a. Fenit. Nunca mais deixou de visitar o país: "Vi o Brasil crescer e se desenvolver de uma forma extraordinária", disse em entrevista exclusiva à Folha por telefone, de Paris. Durante a conversa, Cardin falou ainda da moda do ano 2.000, dos problemas financeiros da alta-costura e de seus 40 anos de trabalho.
Folha – Como o senhor se sente completando 40 anos de carreira?
Pierre Cardin – Para mim isso é uma coisa normal. Nunca parei de trabalhar e nós nos damos conta da importância do nome através da criatividade. Esse é o porquê da importância do nome Cardin no mundo e porque é tão "avant-garde". A nova coleção com 150 modelos impressiona bastante.
Folha – Como o senhor vê a moda hoje?
Cardin – É tudo uma questão de clima, não dá para pensar numa mesma moda em países quentes ou frios. É necessário menos roupas em países quentes como o Brasil. Agora existe também uma evolução diferente, estamos chegando ao ano 2.000. Devemos nos dar conta de que a moda não terá mais os mesmos critérios para a sua existência como teve no passado. O lazer tem um lugar importante na vida do homem, existe mais movimentação, menos lugar para formalidades. Por isso a moda teve que se tornar mais leve. No ano 2.000 tudo estará modificado – a moda, os pensamentos e os hábitos.
Folha – Que aspecto da moda foi mais afetado?
Cardin – É certo que a moda não tem mais a mesma força que antigamente. Mas é um fator social: a falta de criatividade levaria ao desemprego, pois muitas profissões dependem da indústria de moda.
Folha – E a alta-costura, o sr. acredita na crise?
Cardin – Sim, a alta costura é o que nos causa maior tristeza. A juventude não quer saber de alta-costura, está mais interessada no lado esportivo e informal da moda. As reuniões sociais e mundanas evoluíram e a moda está muito mais descontraída, mais livre. Mas ao mesmo tempo, é menos preciosa.
Folha – Isto pode significar o fim da alta-costura?
Cardin – Não completamente, porque sempre vão existir mulheres que gostariam de possuir coisas belas e caras, assim como possuir uma bela jóia. Tendo os meios financeiros para tal, não vejo porque não comprar roupas de alta-costura, e ter assim uma exclusividade. Isto sempre vai existir. Mas a alta-costura será limitada já que agora existe o prêt-à-porter, que fez um enorme progresso.
Folha – Qual a diferença entre a moda de quando o sr. começou e agora? Quais as maiores dificuldades para os iniciantes?
Cardin – Antigamente, os estilistas aprendiam a profissão durante anos, nas grandes "maisons". Agora creio que no futuro existirão os estilistas de talento, mas de pouca duração, assim como os novos atores e atrizes de Hollywood não têm o mesmo peso das grandes estrelas dos anos 40 e 50. É a rapidez dos tempos modernos. Hoje tudo acontece muito rápido.
Folha – O senhor acredita que seja necessário uma volta à técnica?
Cardin – A técnica hoje está a serviço da inteligência da máquina, mas os criadores serão sempre necessários. É a criação que cria a diversidade e que cria o desejo. Mas graças às máquinas, tudo ficou simplificado, não há necessidade de grandes esforços. A tecnologia mundial se aproxima cada vez mais.
Folha – O senhor tem algum estilista que admira?
Cardin – Não gosto de citar nomes porque acho que toda geração tem seus talentos, não existe nacionalidade na moda.
Folha – Qual o conselho que o senhor daria aos aspirantes a estilistas?
Cardin – Aprender a fundo a sua profissão. Mesmo sabendo desenhar, é necessário se aprofundar na profissão, senão não há qualidade. Tem que saber costurar. O sucesso total é difícil, mas só depende de nós. Não adianta depender de ninguém.
Folha – "O Conto do Bicho da Seda" é seu primeiro livro. Existem outros projetos de livros?
Cardin – "O Conto do Bicho da Seda" é uma história que minha irmã me contava quando eu era criança. Quis escrever algo mais poético. No momento, não há outros projetos. Já tentaram escrever minha biografia, mas eu não permiti. Acho desnecessário, porque só interessa a mim. Prefiro trabalhar.
Folha – Como o sr. vê a concorrência?
Cardin – Sempre existiu, mas o que fez com que a marca Pierre Cardin se tornasse uma potência mundial foi a minha virada profissional há 30 anos com o prêt-à-porter. Naquela época eu antevi o sucesso do prêt-à-porter.
Folha – O sr. se considera um precursor, hoje em dia?
Cardin – Sim. Eu tenho um estilo próprio, uma personalidade. Na vida o mais difícil é conseguir ser você mesmo.
Folha – Qual a diferença básica na criação de uma moda feminina e masculina?
Cardin – A moda para mulheres muda mais, podemos brincar com coros, tecidos e material. Pode ser mais facilmente modificada, apesar das grandes mudanças na moda masculina.
Folha – O que gostaria de fazer que ainda não fez?
Cardin – Gostaria de viver ainda mais.
Devido à entrevita com Pierre Cardin, excepcionalmente hoje não publicamos a seção "egos & ids".

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