São Paulo, terça-feira, 1 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A agricultura na revisão constitucional

AMILCAR GRAMACHO

O desenvolvimento das economias em todos os quadrantes do planeta e a democratização crescente dos regimes de governo parecem constituir, neste final de século, uma base sólida para sustentar um processo amplo e contínuo de globalização dos mercados. Nesse processo, os benefícios decorrem basicamente de se explorar convenientemente as vantagens comparativas de cada país. Quanto mais cedo e mais amplamente o Brasil se incorporar às correntes do mercado internacional, maiores serão as oportunidades para alavancar a conquista de novas posições nesse mercado.
A geografia e a história do nosso país têm-nos mostrado a potencialidade dos nossos recursos naturais. Dispomos de amplas extensões de terras agricultáveis e de condições climáticas favoráveis. Produtos como café, açúcar, algodão, sisal, cacau, laranja, frutas e soja, entre outros, foram e continuam sendo fontes de sustentação para milhões de empregos.
Ao mesmo tempo, estamos nos tornando cada vez mais dependentes das importações de alimentos e matérias-primas agrícolas que, em 93, teriam atingido 9 milhões de t, o equivalente a US$ 1 bilhão.
O que é mais grave nessa dependência é que ela se deve muito menos à maior competitividade dos agricultores estrangeiros do que à ação de alguns países desenvolvidos. São mais de US$ 300 milhões anuais de subsídios utilizados para abrir espaços nos mercados internacionais e – com a complacência de nossas autoridades – no nosso próprio mercado interno. Com a recente conclusão da Rodada Uruguai, do GATT, uma luz se acendeu, indicando que esse túnel pode ter um fim, ainda que distante.
Mais difícil tem sido as negociações em torno de um acordo interno, entre os Estados, para que cessem sua discriminação contra a agricultura. A maior delas, gravada na atual Constituição, é a cobrança do ICMS (Art. 155, parágr. 2º), ao mesmo tempo em que fixa como responsabilidade da União compensar os Estados exportadores pela perda dessa receita (Art. 159, II). Os produtos primários, agrícolas e minerais, e os semi-elaborados, contudo, estão sujeitos ao imposto.
Essa injustiça foi repudiada na revisão constitucional que está em curso. Numa avaliação das 35 emendas apresentadas sobre o mencionado dispositivo (art. 155), 34 julgaram-no discricionário contra o setor agrícola e contra os produtos semi-elaborados. A única exceção, apoiando a manutenção do "status" atual, foi subscrita por um parlamentar da região norte do país, cujos Estados têm no extrativismo e na exploração mineral suas principais atividades.
Dentre todas, porém, o deputado-relator Nelson Jobim deverá avaliar com maior consideração a emenda popular (uma das cinco que foram encaminhadas ao Congresso) que foi assinada por 15.877 agricultores e encaminhada por suas entidades de classe.
Ao postular tratamento isonômico às exportações do setor primário, a emenda pretende estabelecer condições mais justas em termos de competitividade nos mercados, para que também a agricultura possa trazer, aos empresários e trabalhadores do enorme interior brasileiro, os benefícios da abertura dos mercados internacionais.
Sabe-se que é uma tarefa difícil para o Congresso, principalmente quando o assunto se insere na questão tributária e na repartição da receita entre as unidades federadas. Contudo, os avanços da democracia brasileira nestes últimos anos e da postura da sociedade em relação às relações econômicas com o resto do mundo, permitem acreditar que essa conquista esteja muito próxima. Ela é a maior reinvidicação do setor ao Congresso Revisional.

Texto Anterior: Região tem maior área cultivada do Estado
Próximo Texto: Retenção; Balanço; Reflexos; Consumo menor; Palmitos; Campanha do ovo; Robovo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.