São Paulo, quarta-feira, 2 de março de 1994
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Cultura mostra realidade da nova China

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Desde o século 13, com Marco Polo, o Ocidente se diverte com a redução da China à condição de curiosidade exótica. As exceções à regra foram instrutivos relatos de viagem e, com a mídia moderna, o bom jornalismo.
"China: os novos mandarins", documentário que a TV Cultura exibe hoje às 22h30, faz parte dessa visão mais refinada de um país cheio de números superlativos –1,2 bilhão de habitantes, 227 milhões de aparelhos de TV, 150 milhões de miseráveis– e que há oito anos experimenta um acelerado processo de transformação social e econômica.
A repórter Maria Cristina Poli desembarcou na China em outubro com seu olhar bem brasileiro. Foi capaz de enxergar sem moralismo excessivo o ressurgimento da corrupção e das garotas de programa que se vendem por US$ 20 nos hotéis frequentados por homens de negócios estrangeiros. Trouxe de volta, com sua equipe, imagens contraditórias sobre os resultados, no cotidiano, da proposta de "economia socialista de mercado", com que Deng Xiaoping enterrou de vez a ortodoxia maoista.
A China não é apenas o dragão que poderá um dia, por meio de uma guerra em que os bens de consumo substituem as armas convencionais, engolir o Japão e palitar os dentes com os tigres asiáticos. Ela é também um poço de problemas relativamente novos, de hábitos de consumo recém-criados, da insegurança provocada, no campo, pelo desmantelamento das cooperativas coletivizadas e, na cidade, pela aparição do desemprego e da indigência.
O documentário mostra isso e bem mais com bom humor e sensibilidade. A gerente de uma loja de departamentos em Xangai constata, a partir do lucro mensal de US$ 3 milhões de sua empresa, que "os chineses descobriram o prazer de consumir".
No circuito do mercado, surge o primeiro milhão de empresários com suas fortunas e seus automóveis importados. São os mandarins do pós-maoismo. Em Shenzen, cidade setentrional que funciona como laboratório do capitalismo e é hoje responsável por 8% do PIB chinês, o proprietário de uma fábrica de cosméticos circula em Mercedes e se torna mecenas ao doar US$ 100 mil para estimular a música clássica.
As imagens da nova China são incrivelmente feias ou belas. Há pouco meio termo. Elas permitem uma visão mesclada, curiosa, por vezes delicadamente caricatural, deste país muito diferente para ser compreendido e muito grande para ser ignorado. Um país que é sem dúvida um laboratório em escala ampliada dos problemas que serão determinantes para o homem no século 21.

Programa: China - Os Novos Mandarins
Onde: TV Cultura
Quando: Hoje, às 22h30, com reapresentação no sábado, às 22h30

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