São Paulo, quinta-feira, 3 de março de 1994
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Bonengel fala sobre o polêmico 'Neonazi'

LEON CAKOFF
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE ROTERDÃ

Winfried Bonengel, 33 anos, nasceu em Munique. Antes de se mudar para Paris em 84, para estudar cinema na ESRA foi assistente de direção teatral no grupo de Tankred Dorst. O seu longa de estréia "Beruf Neonazi" (Profissão Neonazista) é a polêmica da temporada européia. Presente no Festival de Roterdã, Bonengel falou com exclusividade à Folha.
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Folha - O que foi que o motivou a realizar um documentário tão explosivo?
Winfried Bonengel - Para provocar reações contra o racismo. Eu nunca tinha pensado em agir politicamente na vida. E agora me vejo agindo assim. Penso que é um jeito das pessoas reagirem contra este movimento que cresce por todos os lados e ainda há gente que finge que não está acontecendo nada de anormal.
Folha - Você se incomoda em ter se tornado um especialista na temática do neonazismo?
Bonengel - Em dois anos e meio já rodei 15 filmes e escrevi um livro sobre os neonazistas. O livro –"Acerto de Contas", na tradução do alemão– foi publicado na Alemanha, Japão, Dinamarca e Noruega. Fico incomodado de trabalhar tanto sobre o tema. Por outro lado fico ainda mais incomodado de ver que o movimento neonazista cresce em todo o mundo. A televisão italiana quis me contratar para dirigir um documentário sobre o recrudescimento do fascismo na Rússia e no Leste Europeu. Não aceitei. Posso até continuar a filmar no mesmo rumo, mas agora preciso me dedicar a um filme de ficção. Eu mal sabia o que era um documentário antes de estudar cinema.
Folha - Sob que condições Ernst Zundel e Ewald Althans concordaram em ser filmados?
Bonengel - Nenhuma condição foi imposta por eles. Ewald é um exibicionista. Sua regra de conduta, ele diz, é, any news is good news... Falem bem ou mal, para ele o importante é estar presente na mídia. O que fizemos foi segui-lo por toda parte. Confesso que na Polônia foi insuportável ver as suas provocações, especialmente em Auschwitz. Mas, graças a todos estes filmes, descobrimos muita coisa chocante. Acabo de rodar um outro documentário em vídeo "Er war der Fuhrer von Brlin", que foi responsável por convencer a um militante (Ingo Hasselbach) a sair do movimento neonazista depois de fazer muitas denúncias. Descobrimos com ele que há neonazistas em Berlim contrabandeando armas dos russos faz muito tempo... O que Ewald não nos deixou filmar foi sua vida privada, com exceção de uma visita que filmamos com ele à casa de seus pais. Ele não assume no filme, por exemplo, que é gay e nem pode frequentar os clubes gays na Alemanha.
Folha - Como se dividem as opiniões sobre o filme?
Bonengel - Mesmo na Alemanha, 85% das críticas foram a favor. Os artigos contra não foram escritos por críticos de cinema e sim por cronistas políticos. Para mim é uma forma de eles esconderem o fracasso por não terem previsto o crescimento do racismo. A polêmica na Alemanha só começou com uma campanha desencadeada pela revista "Del Spiegel", que depois comprou os direitos de exibir "Profissão Neonazista" na televisão alemã. Parece uma contradição mas é uma jogada de marketing. "Der Spiegel" é dona de dois horários importantes em redes privadas de televisão –a RTL e a Vox. A polêmica deve fazer parte da estratégia comercial deles. É muito esperto do ponto de vista comercial, mas não do moral. Não fiz um filme para apontar soluções. Só mostro que a realidade é pior que a ficção. Que cada pessoa encontre uma solução para o problema. Hoje é arriscado viver na Alemanha.

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