São Paulo, quinta-feira, 3 de março de 1994
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A revisão que não anda

A revisão constitucional, iniciada formalmente há cinco meses, continua até hoje a desafiar a compreensão e a paciência da população. Nesse tempo, o processo esteve por várias vezes ameaçado, esboçou deslanchar e volta hoje a patinar em direção no mínimo incerta. Essa lentidão dos parlamentares em conduzir o processo chama ainda mais a atenção quando se nota que cresce no país o consenso de que uma estabilização definitiva da economia passa necessariamente por mudanças estruturais as quais, por sua vez, dependem de uma reforma da Carta de 1988.
Não se trata de ignorar que o Congresso tem-se debruçado sobre algumas questões também cruciais, como a CPI do Orçamento e o Fundo Social de Emergência. O que não se pode é utilizar esses debates como desculpa para entravar o andamento da revisão, como já ameaça acontecer com a votação da medida provisória que cria a URV.
O acúmulo de tarefas é um falso problema. Não existiria se não fosse a tradicional aversão de boa parte dos parlamentares ao trabalho –ou, pelo menos, a um ritmo de trabalho compatível com suas responsabilidades. Afinal, pelo menos num momento excepcional como o de hoje, em que se encontram nas mãos de deputados e senadores decisões de enorme importância, seria de se esperar um comparecimento maciço e sistemático. Nem assim.
Outro problema é o avanço do calendário eleitoral, que já começa a gerar gritantes distorções de prioridades, nefastas para a reforma da Carta. É assim que questões menores, mas de interesse direto para muitos políticos, como o casuísmo indecente da proposta de redução do prazo de desincompatibilização já para este ano, têm sobrepujado temas muito mais relevantes.
Ocorre porém que o tempo –e o prazo da revisão que se encerra em 31 de maio– avança inexorável. É preciso que o Legislativo supere a sua notória abulia e comece urgentemente a dedicar à revisão a atenção e o empenho que ela requer. Afinal, basta uma agenda mínima de mudanças, enxuta, mas criteriosa, para melhorar sensivelmente a Constituição. E é obrigação mínima do Congresso dar ao país um cenário que torne pelo menos possível uma estabilização definitiva da economia e uma retomada sustentada do crescimento.

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