São Paulo, sábado, 12 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O brasileiro só é absoluto na hora do gol

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, os dois maiores espetáculos que o futebol nos deu nos últimos dias estarão amanhã no palco e na platéia do Morumbi.
Por um lado, a magnética corintiana, que deu no domingo, no mesmo Morumbi, um exemplo de suporte poucas vezes visto na história do futebol, demonstrando a força real da massa que tem fé.
Poderia-se dizer, no caso da torcida do alvinegro, que, como nas realizações do teatro moderno, palco e platéia romperam seus limites específicos. O espectador passou a ser protagonista, a torcida passou a interferir diretamente no resultado do que ocorria no campo.
Mais modernamente, chegaríamos a dizer que foi um dos maiores e mais belos exeplos de linguagem interativa –que é o que a comunicação contemporânea anda buscando.
Por outro lado, teremos o Palmeiras, que realizou, na última quarta-feira, aquela que talvez seja a sua mais bela exibição, desde os tempos da gloriosa Academia.
Meus amigos, meus inimigos, que diferença faz um futebol com gols! Há uma qualidade metafísica no gol que, inexplicavelmente, transforma o nada em ser, o contingente em duradouro, o efêmero em sublime.
Quando o São Paulo fez a sua monumental exibição, aqui, pela mesma Libertadores da América, no ano passado, contra o Universidad Católica do Chile, o título desta coluna foi "hoje é dia de beijar os pés de um são-paulino".
Pois bem, esta é a semana de beijar os pés de um palmeirense.
E amanhã é dia de festa dos nossos trapos colorido.
O gol, além do significado metafísico, parece ter uma particularidade para nós. O brasileiro só é absoluto na hora do gol. O gol significa para nós uma espécie de libertação.
Daí o nome perfeito de Libertadores da América –contra o pânico do gol europeu, contra a opressão da ideologia colonizadora do defensivismo total. O gol é a nossa identidade cultural. O gol é a nossa abastança. O gol é a nossa reserva de valor internacional.
Nenhum outro país foi talhado para o gol como o nosso. Quando um time com a camisa verde e chamado Palmeiras (somos também o único país que tem o nome de uma árvore– faz seis gols, este ato nos devolve ao eden, à visão paradisíaca.
O gol é um dos retratos do Brasil, como diria o pai do Chico Buarque –que deu no couro pelo Polyteletras, fez coro e coroou com a sua música esta semana divina da bola em São Paulo.
Quando a gente pensava que ele, o futebol brasileiro, não vinha mais, ele chegou. Acendam os refletores, por favor, que nós queremos correr para o abraço do gol.
Campanha
Você sabe qual é o slogan da campanha que o Japão faz para sediar a primeira Copa do próximo milênio?
O Japão ama os gols.
A gente também "amamos". Menos o Zagalo.
Bate boca
Se o presidente da Fifa, que é brasileiro, faz, se o presidente da CBF faz, se o técnico da seleção faz, por que não os jogadores?
O pior das declarações do Romário sobre o Pelé é que elas, mais do que um caso de indisciplina particular, revelam uma época e uma conjuntura.
A época é esta mesmo, de valores degradados. A conjuntura é uma seleção com o comando fragilizado. Se esta situação perdurar até a Copa...

Texto Anterior: Papin quer deixar a equipe do Milan; Werder estuda processar Mattheus; EUA e Coréia do Sul jogam hoje; Porto é autorizado a usar seu estádio; Jogador passa por exames na polícia; Rezende diz que não houve erro
Próximo Texto: Iú-ar-ví
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.