São Paulo, sábado, 12 de março de 1994
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Iú-ar-ví

FLAVIO GOMES

São dias de terror, esses que precedem o GP do Brasil. Para mim, pessoalmente, por dois motivos. Passo a ser o cara mais requisitado da praça. E aí, rola um convitinho? Pinta um ingressozinho? Tem jeito uma credencial? Não, não rola, não pinta e nem tem jeito. O pior não é o assédio, que tiro de letra. É, sim, a expectativa da chegada de um jornalista amigo meu, suíço, chamado Luc sei-lá-do-quê.
Luc é um magricela calvo, que usa óculos fundo de garrafa e, além de escrever sobre Fórmula 1, deve fazer uns bicos para a seção internacional da Gazeta de Genebra ou da Folha de Zurique. Cada vez que vem ao Brasil, encontra um país diferente. Moeda nova, presidente novo, câmbio novo.
É inevitável. Na quinta-feira, véspera do 1º treino em Interlagos, ele vai me pegar pra cristo. Luc vai querer explicações sobre estas glebas, que devem ser muito interessantes para seus leitores.
Em 90, ele parecia uma barata tonta tentando entender o plano econômico do infeliz. Como eu poderia explicar que ele não podia trocar seus dólares porque não havia moeda nacional circulando? Não lembro a história que inventei, mas parece não ter colado porque flagrei uma conversa dele com o editor e pesquei um inconfundível "não tem nada de novo acontecendo aqui", em bom inglês.
No ano passado, se não me engano, houve uma reforma ministerial no governo Itamar na semana do GP. E lá vinha o Luc atrás de informações. Eu não sabia quantos nem quais ministros haviam dançado. Chutei: todos. Aqui se muda ministro como se troca de cuecas, disse, numa frase de efeito. Ele pulou da cadeira para ligar para o editor. Acho que tenho alguma responsabilidade pela imagem deste país lá fora.
Agora vou ter que explicar para o Luc o que é URV. Iú-ar-ví, vou repetir centenas de vezes. Ele vai me perguntar qual a moeda do Brasil e eu não vou saber dizer. Claro que vou contar também o caso da Lílian Ramos, ele vai querer detalhes, e como é que eu fico?
Mas o cara é amigo. Na F-1, é muito comum jornalistas trocarem informações sobre pilotos e equipes de seus países e o Luc é um desses com quem eu falo bastante. É verdade que dou Senna, McLaren e Williams e recebo de volta as últimas da Sauber. Não vejo a hora de a Suíça entrar em crise, disparar sua inflação e trocar de primeiro-ministro. Quero ver como é que o Luc vai se explicar comigo.

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