São Paulo, segunda-feira, 14 de março de 1994
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David Bowie faz alegria das Aranhas de Marte

RITA LEE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Tem oba oba no roquenrou. Dois CDs voadores do meu primossauro David Jones, mais conhecido como David Bowie, pousaram no Brasil para a alegria geral da Mocidade Unida Aranhas de Marte, da qual sou orangotanga de auditório. Digamos que em matéria de David Bowie me sinto uma Lecy Brandão.
Essa coleção (diet demais para as calorias do rapaz) é uma grande oportunidade para os cinquentões adolescentes recaírem na gandaia andrógena (lembra?) pré-Aids que meu querido priminho tão bem nos iniciou com o Garbo de uma Greta porta-bandeiras. Quanto a você, teenager curioso, mamma Rita garante uma paixão instantânea pelo tio Ziggy. Periga até mesmo você se tornar uma noviça do vício ou um "absolute beginner" do rock "bon gourmet".
Jóia mesmo seria se a EMI lançasse em CD todos os discos de primo Bowie –ele e eu bem que merecíamos. Anyway, os roquenredos dessas collections 1 e 2 evoluíram muito bem na avenida do meu toca-discos, como sempre, mas vou descontar pontos pela absurda ausência (entre várias) de "Alladin Sane" como destaque. Isto é imperdoável, é inadmissível, é, como diria a colega Lecy, um boicote ao camarote nº 1 desta verdadeira paixão intergaláctica! Puxa vida, estou eu aqui falando em cerveja –argh! puááá! vomit, eta bebida chinfrin, além do que primo Bowie jamais seria um cantor de cervejaria, sã?
Dueto na cama
Fiquei também na fissura de mais material fotográfico. A capa é de Peter Gabriel mas relax. Dueto mesmo só com Mick Jagger, em "Dancing in the Street". Segundo Angie Bowie, a ex-wife, o dueto entre os dois também existiu num dancing in the... sheets! Pena que ela não foi convidada, não é mesmo? Mas acabou ganhando uma musiquinha de consolação do Jagger (eta língua).
Quando Bowie veio para cá, quase morri de vergonha com a falta de glamour com que ele foi tratado pela gentalha de platéias e mídias viciadas em conjuntinhos de Seattle ou em parada de sucesso de novela. Pior pra eles, porque eu aproveitei para respirar o ar de sua graça, no backstage do Olympia, minutos antes do show. Fiz meu número esotérico super-ensaiado e no fim coloquei um cristal phantom na palma da mão dele que imediatamente cobriu a minha. Eu quase desmaiei.
Ele me agradeceu muito, tirou uma foto bem juntinho, me deu um autógrafo (observei as unhas bem aparadas e um anel misterioso no dedo de Vênus) e por fim me desejou, imagine, que curtisse o show dele. "I surely will", disse eu, limpando a baba, "I'm such an old fan of yours", ao que aquele príncipe encantado respondeu sorrindo: "Oh! yes, I'm such an old singer, ah, ah".
Proposta de casamento
Imediatamente tomei aquilo como uma proposta de casamento e aceitei sem pensar. Eis que meses depois, de lá do altar, toda de branco, recebo a trágica notícia de que fui traída com requintes de crueldade. David Bowie casou-se com... Iman! (que nome pegajoso, eu hein?) Puxa vida, sempre tenho que enfrentar um lado horrível com relação à vida amorosa dos meus ídolos. Oh! céus, oh! vida, oh! "Rock & Roll Suicide"!
Assisti Bowie em Londres no gargarejo e babei quando ele entrou no palco, magérrimo, segurando a coleira de dois bailarinos-acrobatas fantasiados de dálmatas, enquanto cantava "Diamond Dogs". Foi duro me tirarem do Lyceum naquela noite, mas vejam vocês, sobrevivi bem a todos os golpes do destino e cá estou mais uma vez de quatro no ato quando vejo a Mocidade Unida Aranhas de Marte desfilar. A escola não ganhou desta vez o que de melhor merecia, mas continuo na comissão de frente. Fala Bowie!

Coletânea: The Singles Collection
Artista: David Bowie
Lançamento: EMI
Formato: dois CDs
Preço: CR$ 10 mil (em média, cada CD)

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