São Paulo, domingo, 20 de março de 1994
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Até o último dia

LUIZ ANTONIO FLEURY FILHO

Minha decisão está tomada. Permanecerei no exercício de minhas funções como governador do Estado de São Paulo até o último dia de meu mandato. Aos que me honraram com seus votos e a todos os brasileiros de São Paulo que acompanharam o meu esforço durante os três últimos anos, ofereço aqui as razões longamente meditadas deste meu gesto.
Parece-me, antes de mais nada, que todos querem e o momento brasileiro exige posições firmes em favor da continuidade administrativa e da estabilidade. É uma exigência da nossa economia. É uma exigência da nossa política. É uma exigência moral.
Comecemos pela economia. Depois de um demorado período de crise, assistimos no ano passado a uma retomada do crescimento econômico, desencadeada em larga parte pelo grande acordo da indústria automobilística de São Paulo. Mais recentemente, o governo federal apresentou um novo plano antiinflacionário, recebido por todos com exemplar boa vontade e desejo de colaborar. Até agora, no entanto, a retomada econômica é frágil e o plano não passa de uma grande esperança. Cabe aos homens públicos zelar para que o processo se desenvolva com harmonia, defendê-lo das paixões e dos interesses pessoais que certamente não faltarão neste ano eleitoral. O Estado de São Paulo, o mais poderoso da Federação, terá um papel essencial a desempenhar. Não é hora de mudar o comando. Não é o momento de se deixar o barco.
Vejamos agora a questão política. Depois de longos meses de atraso, causado pela CPI do Orçamento, o país cuida finalmente da revisão constitucional. Tenho repetido diversas vezes a minha posição inteiramente favorável a uma revisão ampla e corajosa que não fuja aos temas polêmicos e controversos, revisão que há de ser o instrumento da modernização do país. Também aqui o fato de nos encontrarmos em ano eleitoral trará dificuldades. Por isso mesmo, no entanto, é preciso zelo e atenção redobrados. Mais do que nunca, é hora de trabalhar pela revisão. É a que vou me dedicar, profundamente, nos próximos dias.
Desta maneira, como não candidato, terei a liberdade e o tempo para cuidar das tarefas que julgo realmente prioritárias. Parece-me indispensável que os congressistas enfrentem de vez o desafio da modernização do Estado. Já não podemos adiar a flexibilização dos monopólios estatais, nem a criação de novas formas de concessões de serviços públicos e de parcerias entre o Poder Público e a iniciativa privada, nem o estabelecimento de maior clareza nas atribuições e deveres das esferas de poder federal, estadual e municipal. Não há mais como tolerar o labirinto burocrático dos impostos, as regras iníquas da aposentadoria, o caos no qual mergulhou a saúda com a diluição das responsabilidades, as falhas de nossa legislação eleitoral.
Examinemos, por fim, a questão moral. Desde o tempo da campanha eleitoral, anunciei que era minha intenção cumprir integralmente os quatro anos de meu mandato. Sempre me pareceu que este seria o caminho mais correto, do qual um homem político só deveria se afastar movido por circunstâncias excepcionais.
Claro está que o peso político do Estado de São Paulo faz do seu governador um candidato natural à Presidência da República. Se quiser concorrer, não lhe faltarão o incentivo entusiasta de amigos leais e o apoio nem sempre desinteressado de parceiros da política. Uns e outros me procuraram insistentemente nas últimas semanas. Se houvesse seguido seus apelos, estaria neste momento assumindo minha candidatura.
Preferi ser fiel às minhas convicções e à promessa feita a meus eleitores durante a campanha. Sempre afirmei que as ambições pessoais, por mais legítimas que sejam, devem ficar em segundo plano quando se considera o interesse maior do país. Repetidas vezes, e ainda na semana passada, aqui neste mesmo espaço de jornal, afirmei que o meu governo não estava voltado para as próximas eleições e sim para as próximas gerações. Assim sendo, por uma questão de coerência, não me restava outra alternativa.
A decisão de permanecer no governo do Estado me permitirá zelar pessoalmente pela consolidação administrativa do meu governo. O ano de 94 será certamente o melhor de meu mandato. Será o ano da hidrovia Tietê-Paraná, com as eclusas de Três Irmãos e Jupiá, abrindo o caminho até Itaipu. Será o ano do rio Tietê, com a queda de sua poluição pela metade, num processo irreversível. Será o ano das 200 mil casas populares. Será o ano da rodovia Carvalho Pinto terminada. Será o ano da consolidação da grande reforma educacional do Estado, com as escolas-padrão nivelando o ensino paulista pelo alto. Será o ano do saneamento básico.
Acima de tudo, 94 será o ano da continuidade administrativa e da colheita dos frutos do trabalho de todos os brasileiros de São Paulo, o ano da inauguração de pelo menos duas obras por dia, desde já até 31 de dezembro de 1994, final de meu mandato.

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