São Paulo, domingo, 20 de março de 1994
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Manchete revive poesia do "canal 100"

SERGIO SÁ LEITÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Manchete exibe há duas semanas imagens do "Canal 100", cinejornal produzido no Rio de Janeiro entre os anos 60 e 80. Clássicos do futebol brasileiro invadem a tela de segunda a sexta, às 20h25, e domingo, às 14h. Veja e confira: depois do "Canal 100", jamais o balé do esporte foi captado com tal maestria. Em imagens e textos, os filmetes sacralizam o dom maior do futebol –a emoção.
Em sua primeira semana, "Canal 100" mostrou em resumos de cinco minutos algumas pugnas olimpianas. O cardápio reuniu o Fla-Flu que decidiu o Campeonato Carioca de 1969, com vitória de 3 a 2 para o segundo, e a vingança flamenguista de 72, 5 a 2 em atuação de gala de Caio Cambalhota, irmão do palmeirense César Maluco. No programa dominical, ancorado pelo enciclopédico Milton Neves, o ex-juiz Armando Marques acrescentou pimenta aos filmetes, recontando-os.
"Canal 100" era o equivalente nacional dos documentários de propaganda de Hitler e Stalin. Divulgava as realizações do regime militar e exaltava seus protagonistas. Eram os tempos do "milagre", e o futebol tinha um papel vital no "esforço de guerra" dos generais. Mostrava inaugurações de agências do Banco do Brasil, desfiles de moda com a presença de primeiras-damas e as obras que tanto fascinaram Amaral Netto.
No fim, vinha o que todo mundo esperava –o futebol. Um batuque inesquecível ("Que bonito é/As bandeiras tremulando/A torcida delirando/Vendo a rede balançar") anunciava a refrega da semana. Cid Moreira era o locutor e Carlos Niemeyer, o diretor e produtor. "Canal 100" apresentava, então, o que TV nenhuma conseguiu rivalizar. Detalhes tão pequenos de nós todos, em closes de jogadores suados, torcedores eufóricos, músculos e veias.
O futebol do "Canal 100" era registrado em 35mm, em 24 ou mais quadros por segundo –o truque de "acelerar" a filmagem garantia um replay absolutamente nítido em câmera lenta. Com qualidade de cinema, revelava detalhes das partidas frequentemente ignorados por torcedores e pelas lentes da TV: expressões, movimentos, gestos.
A reexibição dos filmetes na TV é um presente para os adeptos do futebol "association". Dá a uma legião de teens uma amostra significativa do passado, com lances de jogadores que hoje seriam meros verbetes de enciclopédia. Aos seus contemporâneos, propicia uma deliciosa viagem no tempo.
Que não se confunda, porém, a nostalgia do "Canal 100', de sua poesia em preto e branco, com a nostalgia do futebol antigo. Os programas são, antes, excelentes remédios para a febre passadista que vez por outra nos assola. Mostram lances geniais, mas também as faltas, os bicos, os gols perdidos, os golpes de sorte e azar que permeavam os espetáculos de 20 anos atrás. Percebe-se apenas que o futebol era outro. Nem melhor, nem pior –diferente.
"Canal 100" fica na Manchete por três meses. Para os domingos, a emissora promete um filmete inteiro, revelando fatos curiosos como as obras do túnel Rebouças, no Rio. Aproveite para gravar –e torça para que Alexandre Niemeyer, que assina a volta do cinejornal, empreste os filmes longos enfocando as Copas de 70, 74 e 78. Está no ar uma aula de filmagem e edição. Responsáveis pela transmissão da Copa de 94 não podem faltar.

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