São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 1994
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O processo

A política econômica deve ser vista como um processo, afirmou repetidas vezes o ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. Entenda-se: nada de surpresas, muita negociação, conquista de resultados consensuais e irreversíveis. Processo aproxima-se, assim entendido, da idéia de progresso.
Nesse espírito concebeu-se uma política econômica em etapas. Primeiro, o ajuste fiscal. Depois, o alinhamento de preços e a indexação sincronizada, via URV. Finalmente a nova moeda, ponto culminante do processo, seria moeda forte porque amparada em fundamentos seguros. Haveria confiança.
Na realidade, entretanto, a política econômica avança ao custo de tornar cada vez menos nítido o ponto de partida e cada vez menos inteligível o ponto de chegada. Como num processo kafkiano, a política de estabilização não parece irreversível, nem decisiva.
O ponto de partida era o ajuste fiscal. É o ponto, aliás, que mais dificuldades abriu no trato com os técnicos do FMI que vieram avaliar o Plano FHC. Aproxima-se a terceira etapa do plano sem que a nova versão do Orçamento, incorporando o Fundo Social de Emergência, tenha sido encaminhada pelo próprio governo ao Congresso.
Toque kafkiano vem dos funcionários do Planejamento, que decidiram entrar em greve exatamente no momento em que se sentiram donos de maior capacidade de pressão. E no Congresso, onde cada parlamentar terá direito a 25 emendas ao futuro Orçamento, pode-se prever mais procrastinação.
O ponto de chegada é o real, mas têm aumentado as incertezas do caminho, atingindo desde a adesão à URV, ainda turbulenta, até a data e lastro da futura moeda.
Entre o processo como avanço gradual e o processo como indefinição recorrente vai-se abrindo assim um vácuo político que tende a ser ocupado, como todo espaço político vazio. A hipótese de o ministro ser candidato a presidente, se não torna esse vácuo mais angustiante, por certo aumenta o suspense quanto ao desfecho do processo.

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