São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 1994
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Dinheiro de plástico

Embora a adesão à URV ainda esteja longe do ideal, aos poucos o embrião da nova moeda começa a ganhar corpo. E esse embrião poderá, à medida que for sendo mais e mais utilizado, permitir que o consumidor brasileiro finalmente experimente viver algumas das vantagens típicas de uma economia sem inflação significativa.
Com os salários e pagamentos simultaneamente denominados numa referência de valor estável, os cartões de crédito, por excelência um "dinheiro de plástico", deverão cumprir a função até agora desempenhada pelos cheques pré-datados. Mais ainda, tende a se reduzir a prática de o comércio superestimar preços à vista para permitir o parcelamento aparentemente "sem acréscimo". Como parcelas futuras em URV já são, por definição, parcelas corrigidas, será desnecessário inchar os preços à vista por precaução. Ou seja, ao mesmo tempo estimulam-se as compras a prazo e a redução dos preços à vista.
O movimento dos últimos dias, tanto em grandes magazines quanto nas administradoras de cartões de crédito, indica um provável aumento do consumo. Há nesse movimento dois perigos. O primeiro diz respeito ao próprio esforço de estabilização. Uma bolha de consumo, motivada pela plena indexação dos salários, traria dificuldades adicionais à queda da inflação. O segundo perigo é o consumidor, animado com a correção mensal dos salários e ainda pouco habituado ao significado de "juros reais", assumir compromissos a prazo que depois não tenha como suportar. Como nas próximas semanas estarão convivendo a superinflação em cruzeiros reais e a URV, é preciso estar atento e aprender a programar orçamentos familiares com cautela.
Ao governo coloca-se também um desafio inédito e inadiável: regulamentar o quanto antes outras operações em URV que ainda dão margem a dúvidas. E, à medida que aumentarem as operações entre comércio e indústria em URV, virá o passo adicional de permitir operações financeiras nessa unidade.
À primeira vista, portanto, vai aos poucos ganhando realidade a idéia de uma moeda de transição. Resta saber se ao longo do processo não surgirão outras dificuldades, como uma bolha de consumo inflada pela emissão de dinheiro de plástico.

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