São Paulo, terça-feira, 22 de março de 1994
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CD clássico vive "boom" de vendagem no Brasil

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

CD clássico vive 'boom' de vendagem no Brasil
O consumidor de música clássica deixou de ser um animal exótico para ganhar o estatuto de segmento –pequeno mas respeitável– no mercado fonográfico. Dos 24 milhões de CDs vendidos no Brasil no ano passado, o gênero entrou com 574 mil cópias. Se não é tanto assim em termos comparativos, o aumento com relação a 1992 já foi de 24%.
"E a tendência é aumentar muito mais", diz Amir Harif, gerente de clássicos da BMG-Ariola. Em outra gravadora, a Sony Music, o gerente de área Sérgio Pommerening constata a transformação do perfil do comprador de ópera, solo instrumental ou peças sinfônicas.
"Não há mais a antiga predominância de pessoas idosas e de uma elite cultural com bom poder aquisitivo", diz Pommerening. Embora as gravadoras afirmem não dispor de pesquisas detalhadas sobre quem seja este consumidor, todas elas observam que o mercado não estaria crescendo se não estivesse ocorrendo um deslocamento em direção ao público mais jovem.
Outra constatação diz respeito à "porta de entrada" dos neófitos que passam a apreciar o clássico. Até há cerca de dez anos, eles ingressavam pelo barroco ou pela sinfonia romântica. Hoje, no entanto, dá para identificar aqueles que se encantam com peças contemporâneas, como forma de compensar a falta crônica de inovações harmônicas do rock e do pop. O sucesso mundial da Terceira Sinfonia de Henryk Górecki é um sintoma forte dessa tendência.
A expansão do clássico em CD –e não apenas dele: o gênero também vendeu no ano passado 80 mil LPs e 37 mil fitas cassete– acontece em condições de divulgação adversas. Em São Paulo, uma única emissora, a Cultura FM, transmite o dia inteiro nessa faixa de preferência. No Rio, a Opus 90, rádio privada com o mesmo perfil, saiu do ar por falta de anunciantes.
"Mesmo sem a ajuda da mídia, parece estarmos diante de um fenômeno de demanda contida", diz Manuel Camero, presidente da ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Discos).
Um outro paradoxo que está no fato de a mídia escrita, o suporte mais inadequado para qualquer tipo de música, ser hoje a única que se refere aos lançamentos e demonstra ao leitor que os catálogos apresentam um leque de opções cada vez mais variado.
E, de fato, as quatro empresas que editam o clássico no Brasil perceberam que não bastava lançar novas versões do "Bolero" de Ravel, da Quinta de Beethoven ou das "Quatro Estações" de Vivaldi, para manter um pé sólido no mercado. As gôndolas nas lojas especializadas –embora de uma pobreza imensa se comparadas ao que se vende na Alemanha ou nos EUA– nunca foram tão sortidas.
"A Sony está há três ou quatro anos lançando anualmente mais de cem títulos", diz Pommerening. A série "Essencial Classics" vendeu em média 3 mil cópias para cada um dos 50 títulos lançados.
No setor, considera-se que uma gravação cobre seus custos de produção com mil unidades vendidas. A BMG, a Sony e a EMI descobriram, há algum tempo, que não poderiam deixar a Polygram praticamente sozinha na praça –é dela o selo Deutsche Grammophon, talvez o mais prestigioso entre todos do segmento– e também decidiram investir pesado.
Saíram ganhando os consumidores descendentes da antiga minoria de animais exóticos que perambulavam de mãos vazias ao procurarem gravações nacionais.

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