São Paulo, terça-feira, 22 de março de 1994![]() |
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"Fausto" demoniza Beethoven
ARTHUR NESTROVSKI
Exilado por anos nas terras do mau gosto e da música de programa, mas recuperado há algum tempo em nome da sua modernidade, Franz Liszt (1811-1886) é agora um dos compositores mais estudados do século 19. As pequenas peças para piano do último período, em especial a "Bagatela sem Tonalidade", assumiram um lugar de prestígio no repertório, e os poemas sinfônicos e outras obras de grande porte são escutados com novos ouvidos e outros interesses, próximos dos nossos. É este o caso da Sinfonia "Fausto" (1857). Essa sinfonia é, por consenso, uma das obras centrais no cânone romântico, ombro a ombro com a "Danação de Fausto" de Berlioz, ou o "Fausto" de Gounod, também composições inspiradas no poema de Goethe. Estilo Naturalista Já no final do século passado, o pai da hermenêutica musical, Hermann Kretzschmar, descrevia o terceiro movimento da sinfonia em termos de uma "liberação do puro som e do puro ritmo", percebendo aí as características de um "estilo naturalista", com origem em Beethoven. É o que hoje se conhece como a "transformação dos motivos": a elaboração de temas contrastantes a partir de elementos comuns entre si. Um mesmo ritmo pode ser empregado em diversas melodias e vice-versa, uma pequena sequência de intervalos pode organizar as mais variadas cenas sinfônicas. A isso se soma uma relativização da forma, com movimento e submovimentos integrados num grande movimento maior. São fatores como esses que levariam um compositor como Bela Bartok a se interessar por Liszt. Descontadas as diferenças de vocabulário, não é tão grande como parece a distância entre o "Concerto para Orquestra" (1943) de Bartok e a Sinfonia "Fausto", ou a Sonata em si menor de Liszt. Demonização Cheia de energia, a interpretação da Orquestra Estadual da Hungria vem amortecida um pouco pela artificialidade da gravação, de quase 15 anos atrás, mas compensa a sonoridade de estúdio com o vigor. A Sinfonia toda é uma espécie de demonização da Nona de Beethoven, que é muito mais seu assunto do que o Fausto de Goethe. Nisto também –na resistência e repetição de Beethoven– Liszt é um foco importante, com reflexos na obra de Tchaikovsky, Scriabin e Strauss. Não poderia haver realização maior para um compositor: substituir Beethoven, ou ter pelo menos a ilusão de ser um novo ponto de partida. (Arthur Nestrovsky) Título: Sinfonia "Fausto" Intérpretes: Gyõrgy Korondy (tenor), János Ferencsik (regente) e Orquestra Estadual da Hungria Lançamento: Hungaroton Preço: CR$ 12 mil (em média) Texto Anterior: Pacote Sony traz Yo-Yo Ma Próximo Texto: James Galway oferece "banhos relaxantes" Índice |
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