São Paulo, quarta-feira, 23 de março de 1994
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Seleção despreza o marketing em Recife

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Quando o táxi subiu a rampinha da porta principal do Sheraton Hotel, concentração dos brasileiros em Recife, o cenário não batia com a expectativa: uns 20 adolescentes, com bloquinhos de autógrafos e canetas nas mãos, numa espera silenciosa, quase constrangedora, de seus ídolos.
Nada, nem de longe, parecido com a festa interminável que varou os quatro dias e noites em que a seleção se hospedou por aqui, no ano passado, num jogo fundamental para a trajetória do Brasil nas eliminatórias, quando goleou a Bolívia por seis gols e renasceu das cinzas, lembram-se?
Naquela época, observadores, comissão técnica e jogadores atribuíram grande parte do êxito do nosso time à solar recepção dos torcedores pernambucanos. Aquilo foi o toque mágico que despertou o talento adormecido até então dos nossos craques. Foi um verdadeiro doping natural.
Mudou Recife ou mudou a seleção? A resposta veio por acaso, num papo com uma simpática relações públicas da cidade, no almoço. O problema é que, depois de ter sido recepcionada até com trio elétrico, a seleção fechou-se em si. Nem nas janelas dos quartos, para dar o tradicional adeusinho aos fãs, os jogadores podem chegar. Está no regulamento interno da seleção.
Tal atitude, embora arbitrária e antipática, teria lá sua justificativa, caso estivéssemos em qualquer outro lugar do Brasil, onde as críticas ao time e à comissão técnica se sobrepõem aos elogios. Seria uma tática para evitar as vaias e provocações eventuais dos torcedores que poderiam abalar o moral da equipe. Mas aqui, onde o povo se considera um talismã do nosso time? Essa determinação não tem sentido.
Aliás, não tem sentido que a CBF trate o marketing da seleção com tal desprezo. Num mundo onde o marketing se transformou na principal peça de engrenagem do chamado show business, desprezá-lo é contrariar o fluxo da maré.
Enfim, vamos em frente. Sempre esperando que nossos craques, lá dentro das quatro linhas, consertem os estragos que os cartolas fazem aqui fora.
*
Bem, no finalzinho da tarde, quando a seleção entrou no campo do Arruda para fazer seu treinamento, cerca de 10 mil entusiasmados torcedores tomavam conta das arquibancadas, enquanto centenas de pessoas circulavam em torno do estádio, transformado numa feira livre de ingressos, bandeirinhas do Brasil, barraquinhas de bebidas e tudo o mais que se encontra em dias de jogos.
No treino mesmo, a notar apenas o gol de Mazinho, por cobertura, seguido de olhar entre o malicioso e o inquiridor do jogador lançado em direção ao técnico Parreira.
Mazinho deve jogar, nem que seja meio tempo. Assim como Raí. Mas Parreira estará apenas fazendo algumas observações para desencargo de consciência no jogo desta noite contra a Argentina. O time é aquele mesmo que terminou as eliminatórias, e só as circunstâncias haverão de provocar alterações.
Quanto a esta noite, tanto argentinos quanto brasileiros estão desentrosados, claro. Além do mais, sempre que essas seleções cruzam o caminho tudo pode acontecer.
*
Assim, mais uma vez, nesta tórrida Recife, o calor da torcida deverá ser a melhor instrução tática e o maior estímulo dos nossos jogadores.
Afinal, quando as luzes se acenderem, cada um dos times se sentirá o dono do espetáculo.

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