São Paulo, quarta-feira, 23 de março de 1994
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Spielberg vence em dois frontes

ANA MARIA BAHIANA
ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

Com uma hora de Oscar, o nome de Steven Spielberg já havia sido pronunciado nove vezes, sempre em tons reverentes e gratos, pelos vencedores de quatro categorias. Era, com absoluta certeza, um barômetro do que estava por vir. E o que estava por vir era uma vitória completa de Spielberg, tanto no fronte artístico com "A Lista de Schindler" (prêmios para filme, direção, roteiro adaptado, trilha sonora, montagem, direção de arte, fotografia) quanto no fronte técnico com "Parque dos Dinossauros" (melhor som, efeitos sonoros, efeitos especiais).
Para Spielberg, uma vitória pessoal. Foram dez Oscars que se devem, direta ou indiretamente, ao seu trabalho. Para "A Lista de Schindler", não exatamente um recorde –o maior número de estatuetas numa noite só ainda é de "Ben Hur", 11 Oscars em 1959– mas o maior empurrão publicitário que o filme poderia receber.
"Ganhar um Oscar não era uma meta na minha vida", disse Spielberg na sala de imprensa. "Mas qualquer pessoa que recebe uma indicação e diz que não se importa em ganhar um Oscar está maluco. Este filme para mim é um serviço de utilidade pública –espero que o sucesso dele leve consciência sobre o 'Holocausto' e, com a possibilidade da memória, uma maior tolerância pelo mundo afora."
Pequenas surpresas
A avalanche Spielberg veio no contexto de um dos Oscars mais previsíveis desde a vitória maciça de "Dança com Lobos" (sete Oscars também), há três anos. Mesmo as pequenas surpresas da noite (a menina Anna Paquin, e não Winona Ryder, vencendo como melhor atriz coadjuvante, a derrota de Ralph Fiennes por "A Lista de Schindler", deixando o Oscar de melhor coadjuvante para Tommy Lee Jones) foram, de fato, muito pequenas, escolhas não de azarões, mas de favoritos.
Tolerância
Manifestações políticas? Poucas, a começar pelo "pacote" de posições engajadas que Whoopi Goldberg despejou, de uma vez só, logo no início da noite, e culminando no discurso emocionado de Tom Hanks recebendo seu Oscar. Hanks, aplaudidíssimo na sala de imprensa, parou sua entrevista duas vezes para pôr fones de ouvido e escutar os discursos de agradecimento de Spielberg, comentando: "Eu queria chamar a atenção para o fato de que este ano temos vários filmes com o tema 'tolerância'. Precisamos reaprender essa virtude. Tolerância é algo que precisamos praticar diariamente –é nessa idéia que se apóia a constituição americana."
Nos bastidores, Tommy Lee Jones (com mau humor estranho para um vencedor, reclamando do som mais que Tim Maia e João Gilberto em seus piores dias) revelou o que quis dizer com a frase "sou sortudo por estar trabalhando", em seu discurso de agradecimento: "93% dos atores sindicalizados nesta cidade estão desempregados. Sou sortudo mesmo".
A equipe responsável pelo documentário de curta-metragem vencedor, "Defending Our Lives" –sobre violência doméstica contra mulheres e crianças– agradeceu à imprensa "por trazer o assunto à tona e mantê-lo vivo" e à Academia "por continuar dando Oscars para documentários –eles são um fórum essencial para questões políticas e sociais que a indústria costuma ignorar".
No final da noite, nem surpresas, nem sobressaltos nem controvérsias –nem ao menos um pífio tremor de terra. Um Oscar tranquilíssimo –tão tranquilo que vários jornalistas se permitiram cochilar ao redor do bufê armado nos bastidores, entre um e outro prêmio menos disputado.

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