São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
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Falta de corte constitucional dificulta a solução da crise

CLÁUDIA TREVISAN

A crise entre o Executivo e o Judiciário é agravada pela falta de um órgão constitucional independente, com poderes para dar uma solução que seja obrigatoriamente aceita pelas duas partes.
"O impasse demonstra que no Brasil não existe uma corte constitucional autêntica, com atribuição de dirimir conflitos entre os três Poderes", observa Tércio Sampaio Ferraz Júnior, professor titular de filosofia do direito da Universidade de São Paulo.
O STF (Supremo Tribunal Federal) exerce algumas funções de corte constitucional. Mas, ao mesmo tempo, é o órgão máximo do Poder Judiciário, o que lhe tira independência para julgar o conflito com o Executivo.
"Em países como a Alemanha e a Áustria, a corte constitucional não pertence ao Judiciário e funciona como mediadora entre os Poderes", explica Ferraz.
O cientista político Bolívar Lamounier propõe a convocação do Conselho da República caso não haja solução negociada.
"Entre as atribuições do conselho está a manifestação sobre 'questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas"', diz Lamounier.
O conselho é um órgão de consulta do presidente da República e tem a seguinte composição: vice-presidente da República, presidentes da Câmara e do Senado, líderes da maioria e da minoria na Câmara e no Senado, ministro da Justiça, duas pessoas nomeadas pelo presidente, duas eleitas pelo Senado e duas pela Câmara.
O problema é que suas decisões não devem obrigatoriamente ser aceitas pelo presidente e pelo STF. "Ele não é um órgão deliberativo", diz Ferraz.
Além disso, segundo a avaliação do cientista político Leôncio Martins Rodrigues, "a convocação do conselho seria a prova da incapacidade das instituições máximas da República chegarem a um acordo".
O professor titular de direito constitucional da PUC-SP Celso Bastos acredita que o desfecho pode ser dado pelo próprio STF. Para ele, a decisão de converter os salários pelo dia 20 teve caráter administrativo e não judicial.
"Se o impasse persistir, o presidente Itamar Franco pode impetrar um mandado de segurança contra a decisão administrativa do STF", sugere. O paradoxo é que a ação seria julgada pelo próprio STF.
Só que, desta vez, em sessão de natureza judicial -pública e com manifestação de ambos os lados e do Ministério Público.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, professor titular de direito constitucional da USP, concorda que "a palavra final é do STF".
Mas advogados e cientistas políticos afirmam que o melhor caminho é a negociação."Como não há uma instituição para revolver o impasse, a saída deve ser politicamente negociada", resume o professor titular de direito comercial da USP Fábio Konder Comparato.

Colaborou AUGUSTO PESTANA, da Redação

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