São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
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Passo à frente, passo atrás

O recuo do Senado –aliás, previsível– na escandalosa majoração salarial que a Câmara concedera aos congressistas desanuvia um pouco o pesado ambiente político que paira sobre Brasília. Não foi, contudo, por desprendimento ou altruísmo que os senadores reverteram a decisão, mas sim devido à grande pressão do Executivo e à péssima repercussão do aumento junto à opinião pública.
De qualquer forma, a disposição do Legislativo de negociar sugere que o que se convencionava chamar de a crise dos Três Poderes caminha para tornar-se a crise de dois Poderes, o que não a torna menos preocupante. De fato, o embate entre o Executivo e o Judiciário em torno da data da conversão dos salários dos juízes e funcionários do Supremo Tribunal Federal à URV –em tese uma questão técnica menor– já assumiu proporções muito maiores do que deveria.
A absoluta inoportunidade do aumento salarial que os ministros do Supremo se concederam –e o risco mesmo de a majoração ser estendida a outras categorias do funcionalismo num formidável efeito bola de neve– diminui o espaço para uma negociação.
E, para torná-lo ainda mais estreito, o presidente da República aferrou-se ontem à decisão de não ceder absolutamente nada. Naufragou, assim, o ensaio de negociação entre o seu ministro da Fazenda e ministros do Supremo.
É evidente que a saída para o impasse não passa por aceitar uma carga onerosa para os cofres públicos. Mas é igualmente evidente a necessidade de se manter as conversações no marco da normalidade institucional e do bom senso, de parte a parte. Por mais que o presidente Itamar Franco pareça ter sido empurrado à ação pelos ministros militares, o fato é que as Forças Armadas, como instituição, não ultrapassaram os limites constitucionais.
Por isso mesmo, caiu no vazio o intolerável apelo golpista de um certo Grupo Guararapes. A era dos tanques, felizmente, está enterrada num passado que não pode voltar.

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