São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
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A democracia é a única saída

TASSO JEREISSATI

A democracia éa única saída
Todas as crises, por piores que sejam, políticas ou institucionais; todos os impasses, por mais graves que sejam, só têm uma saída: pela via democrática. Se o Congresso aumenta os seus próprios salários, se o Judiciário discorda daquilo que seria uma mera conta aritmética de conversão de salários e isso se transforma num conflito entre Poderes da República –só se toma conhecimento disso numa democracia.
A democracia é o regime que garante a transparência dos atos de todos os Poderes. Aliás, é só na democracia que existem os três Poderes, independentes, e com harmonia entre eles que impede o arbítrio de um isoladamente. É na democracia que a imprensa denuncia os corruptos, é na democracia que o povo tem espaço para reivindicar; e é quando ele elege e pune os maus políticos.
Todos esses descompassos que geram conflitos ou até mesmo crises institucionais como a que estamos vendo agora, certamente ainda são consequências de um longo período em que os Poderes da República não tiveram seu espaço de atuação perfeitamente definidos. Ainda temos resquícios do regime anterior, quando a sociedade não tinha sequer direito de expressão.
Foi nesse quadro de desajustes que as corporações se fortaleceram. Sempre conscientes de seus direitos e sem se preocupar com seus deveres ou em ver estabelecidos seus limites.
Estamos às vésperas de eleições gerais. Estas eleições, quando serão escolhidos novos deputados federais, senadores, governadores, deputados estaduais e presidente da República, servem como "freio de arrumação" para esses desajustes e conflitos que temos hoje.
Só não se pode cair na tentação de encurtar caminhos, ferindo o calendário eleitoral. O Brasil percorreu uma longa trilha para chegar à democracia que não pode ser atropelada por afobamentos de alguns. Nossa democracia já superou impasses anteriores e tem sempre conseguido se fortalecer. Foi em plena normalidade democrática que, pela primeira vez na história, um presidente da República, eleito pelo voto direto, foi cassado por corrupção. As denúncias de corrupção foram difundidas e investigadas, como permite o regime democrático e a punição foi imposta dentro das normas democráticas –com direito de defesa do acusado.
Se existem erros nas atitudes dos Poderes –e eles existem e muitos são graves–, o pior dos erros é a inexistência desses Poderes. Sem eles não há democracia, não há vontade popular. É de novo o escuro.
É absolutamente inadmissível que uma vasta maioria da população brasileira que ganha menos de dois salários mínimos por mês assista a uma discussão que venha a colocar em risco esses valores fundamentais. Essas divergências que põem em xeque as instituições também ameaçam o sucesso de um plano econômico em que todos os esforços estão sendo feitos com o objetivo de beneficiar a maioria da população –os excluídos, os marginalizados.
As discussões corporativas não podem se colocar acima dos interesses da nação, cujo maior valor é a reconquista da democracia. A sincera revolta da população contra privilégios não pode ser utilizada como ameaça à integridade das instituições.

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