São Paulo, segunda-feira, 28 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

2.000 famílias invadem terreno da prefeitura

TELMA FIGUEIREDO
DA REPORTAGEM LOCAL

Cerca de 2.000 famílias ocupam desde sábado parte do terreno do Jardim São Francisco (zona leste), área municipal que ao todo tem cerca de 1 milhão de m2. Os ocupantes, integrantes do Movimento dos Sem Terra Leste 1, estão acampados em dez barracões feitos de madeira e lona. Eles dizem que não saem do local enquanto não negociarem com o prefeito Paulo Maluf a continuação de mutirões na área. Até ontem à noite não tinham conseguido fazer qualquer contato com a prefeitura.
As famílias que ocupam o local moram em favelas, cortiços e imóveis alugados na zona leste da cidade. O movimento juntou dinheiro através de bingos, rifas e campanhas de rua para levar madeira, alimentos e cobertores ao local.
Nos barracões há cozinhas improvisadas onde as mulheres preparam as refeições. Os moradores de casas vizinhas, que foram construídas através de mutirões, fornecem água para o acampamento.
O movimento também conta com doações da Igreja Católica para viabilizar a continuidade da ocupação. A reportagem da Folha presenciou a entrega de uma doação de CR$ 108 mil, resultado da coleta da Missa de Ramos nas igrejas do setor Sapopemba. Ontem de manhã, no próprio acampamento também foi celebrada a Missa de Ramos, pelo padre Marcelo Álvares Matias, ordenado há menos de um mês.
A diarista Maria Pereira dos Santos, 28, levou três filhas pequenas para o acampamento. Ela diz que fica lá até que o prefeito Paulo Maluf resolva conversar com o movimento. "Não me importo em perder os dias de serviço que for preciso", diz. Maria, que faz parte do movimento há cerca de um ano, mora em um cortiço na Vila Formosa.
"O dinheiro que ganho quase não para pagar os CR$ 30 mil de aluguel, mais luz e água", afirma Maria. Ela descreve o lugar em que mora como uma espécie de porão onde só cabem duas camas. "Meu fogão fica no corredor. Não tem outro jeito", diz.
O marido de Maria está desempregado há mais de dois anos, mas não a acompanhou no acampamento. "Ele acha bobagem o que estamos fazendo. Sempre diz que é coisa que não dá em nada".
Pressão
Na administração da prefeita Luiza Erundina foi feito um Plano Diretor para toda a área do Jardim São Francisco, quando o local foi dividido em oito setores de habitação. Na gestão anterior houve mutirões de autogestão em três desses setores. Aproximadamente 1.300 casas populares foram construídas no Jardim Francisco, com recursos do Funaps (Fundo de Atendimento à População Moradora em Habitação Subnormal).
"Paulo Maluf paralisou esses mutirões. Desde o primeiro dia de sua posse, o movimento procura o prefeito, sem resultados. Essas famílias vão continuar acampadas porque não têm mais nada a perder", diz Evaniza Rodrigues, 24, participante do Movimento dos Sem Terra há seis anos.
Evaniza afirma que Paulo Maluf chegou a garantir que novos mutirões seriam iniciados. "Mas não cumpriu a promessa. No Diário Oficial de 07/04/93, o prefeito cita especificamente o caso do Jardim São Francisco, dizendo que no local seriam construídas 2.000 novas unidades."
O movimento está cumprindo a questão de ordem "Sem negociação vai haver ocupação", colocada durante o acampamento de três dias feito em frente do Palácio das Indústrias em outubro do ano passado. "Vínhamos preparando essa ocupação há seis meses, porque na última vez que acampamos em frente à prefeitura, não conseguimos sequer abrir negociações".

Texto Anterior: Hospital abre espaço para tratamento de dependentes
Próximo Texto: Casa corre risco de cair
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.