São Paulo, terça-feira, 29 de março de 1994
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Itamar assume as rédeas

JANIO DE FREITAS

A escolha do ministro Rubens Ricupero para substituto de Fernando Henrique significa a retomada das rédeas do governo pelo presidente Itamar Franco, em conformidade com o que seus assessores políticos, os oficiais e sobretudo os oficiosos, lhe vinham propondo. Embora fosse uma probabilidade já muito presente no noticiário, a escolha surpreendeu a equipe econômica e, para Fernando Henrique, não deixou de ser uma tripla derrota política –pela recusa à sua indicação, por negar o que informara à equipe e a correligionários políticos e, ainda, pelos esperáveis efeitos futuros.
O presidente Itamar não fez qualquer restrição quando, a meio da semana, Fernando Henrique lhe propôs que Pedro Malan fosse o seu substituto e Pérsio Arida se deslocasse do BNDES par o atual lugar de Malan, a presidência do Banco Central. Mencionou Ricupero como pessoa também qualificada para a substituição. Fernando Henrique concordou, e nem teria por que discordar, mas reafirmou seus argumentos em defesa da sugestão apresentada. Como não houve objeções, saiu certo de que tivera êxito e comunicou este resultado à equipe e a alguns correligionários.
Tão segura estava a equipe da escolha de Malan que, na sexta-feira, um restrito grupo de empresários reunidos com o ministro Beni Veras e com Pérsio Arida, em Recife, soube das substituições tidas como certas. Um dos empresários chegou a brincar com Arida, dizendo que ele falava pela última vez em uma condição, de presidente do BNDES, que em 72 horas já não teria. Ao que Arida respondeu: "Mas não diz isso, não, que pode dar azar".
Em muito menos tempo, Rubens Ricupero já estava confirmado como novo ministro da Fazenda. A equipe, na verdade, confiou cedo demais no êxito de Fernando Henrique com Itamar (e aqui reproduzi este excesso, ao informar que "Pedro Malan deverá ser o novo ministro"). Quando jornalistas aliados de Fernando Henrique começaram a publicar que, se ele saísse candidato, faria o seu sucessor e teria o apoio do presidente, os amigos de Itamar e, depois, o próprio retrucaram que "quem escolherá o ministro será o presidente". A substituição passava a ser posta em termos de brios. Fernando Henrique não faria o substituto nem que indicasse um gênio.
Como ministro, Fernando Henrique foi o comunicador da equipe, do que ela decidia. Pedro Malan seria a própria equipe falando, mas não a equipe dele. Ainda a de Fernando Henrique. Como procederá Rubens Ricupero em relação à equipe, não se sabe. Nem em relação a Itamar. Pode-se presumir, no entanto, que não demonstre a mesma complacência do ministro-candidato com os grandes interesses econômicos. A equipe admite, por exemplo, que ao ser definida a introdução do real haja, nos 30 dias seguintes, uma corrida de preços capaz de elevar a inflação a 50% e até a 60%. Para a equipe, tudo bem, porque imagina que depois a inflação cai. Para Ricupero, dificilmente estará tudo bem. Para Itamar, certamente não. Como o ministro, a equipe e o presidente vão se entender, é a nova charada brasileira. Bem antes disso, aliás, a preterição de Malan já mostrará um dos seus efeitos: com Ricupero sairão logo as medidas duras contra especuladores de preços, que não sairiam com Malan ou outro qualquer da equipe.
A integridade e a desambição de Ricupero são tranquilizadoras para Fernando Henrique. Mas não compensam a perda política par ao candidato: Fernando Henrique não continuará como líder da equipe econômica, o que é uma perda para o candidato. E corre risco de que aconteça, sem violentar o plano, um combate aos abusos de preços que, se bem sucedido, o deixará como o candidato que protegeu oligopólios em vez de dar-lhes o combate demonstradamente possível –e assim por diante.
A idéia central do plano ficará. Mas o que a circunda tende a mudar.

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