São Paulo, quinta-feira, 31 de março de 1994
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Escola de horrores

O conceito que hoje se faz de criança é, infelizmente, muito recente em termos históricos. Grosso modo, durante a maior parte da Antiguidade e da Idade Média, a criança era vista como um adulto de proporções reduzidas que não sabia falar. Não é por outra razão que a palavra latina para criança, "infans" (que está na raiz dos termos portugueses "infantil, infância"), significa apenas "aquele que não fala". Fenômeno análogo se observa nas pinturas pré-renascentistas, nas quais as representações de crianças apresentam quase invariavelmente as feições de um adulto.
E a evolução no Direito foi ainda mais lenta. É só no século 20 que vão surgir leis que efetivamente protegem as crianças de maus-tratos, seja por parte de pais ou professores. Entretanto, é com o advento da psicologia e pedagogia modernas que se vão reconhecer as peculiaridades das crianças e se vai procurar educá-las de acordo com uma base científica.
É claro que há muito mais a fazer e a descobrir. À luz dessa lenta evolução, causa a mais profunda revolta em toda a sociedade a notícia de que uma escola particular paulistana vinha explorando sexualmente crianças de quatro anos de idade –inclusive com casos de violação–, provavelmente para produzir fotos e vídeos pornográficos. Trata-se, por certo, de um caso isolado –daqueles que podem acontecer em qualquer país do mundo. Enfim, um caso de polícia que exige a punição dos responsáveis com as penas máximas da lei.
Ainda assim, ao observar a situação da infância no Brasil –garotos de rua, prostituição infantil, grupos de extermínio de menores e mesmo episódios hediondos como o da escola paulistana– chega-se à triste constatação de que as leis de proteção à juventude, aqui, estão longe de de fato protegê-la. E é bom que governo, sociedade e cada cidadão individualmente se empenhem em mudar rápida e radicalmente essa terrível situação. Antes que a infância brasileira resgate o seu sentido latino, e se cale para sempre.

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