São Paulo, quarta-feira, 6 de abril de 1994
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As eleições e os empresários

ODED GRAJEW

Mais uma vez aproxima-se a grande oportunidade de mudar o país. Chegou a hora, portanto, de essa parcela tão importante da sociedade, que são os empresários, colocarem a mão na consciência para uma reflexão sobre esse momento histórico.
Do ponto de vista da sociedade, aí incluídos os empresários, o eleitorado viveu grandes frustrações desde a eleição do ex-presidente Fernando Collor. Basta dar uma olhada no Mapa do Mercado de Trabalho do Brasil, preparado pelo IBGE, e que agora fornece valioso subsídio para a segunda fase da Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria, voltada a estimular a geração de emprego.
O Brasil, que ontem acreditava nas promessas de Collor de acabar com a fome e os descamisados, tem hoje 2 milhões de crianças entre 10 e 13 anos que trabalham, 14 milhões de trabalhadores sem carteira assinada e 5 milhões que trabalham sem remuneração.
É difícil dizer se algum desses dados é mais ou menos estarrecedor que o fato de 8 milhões de pessoas trabalharem mais que 40 horas semanais e ganharem menos de um salário mínimo... ou que existem no país 12 milhões de pessoas ocupadas que ganham menos de um mínimo, o que representa 20% do total da população ocupada.
Certamente, os empresários, enquanto cidadãos, não desejam a perpetuação desse estado de coisas. E, enquanto empresários, preferem que os atuais 20 milhões de subtrabalhadores tenham sua renda elevada e se transformem em consumidores.
Portanto, a primeira conclusão que surge desse retrato do Brasil é inescapável e ineludível: a prioridade do próximo governo terá de ser a questão social, o combate à miséria.
Falemos agora de um fato desagradável. É inegável que os políticos indiciados pela CPI do Orçamento foram eleitos com contribuições de empresários. Espero que a lição tenha sido aprendida. Esse tipo de político desviou recursos de áreas sociais; portanto, aumentou o déficit público, gerando mais desemprego, miséria e inflação. Isso levou à necessidade de aumento de impostos, tais como o IPMF. É isso que dá empresário apoiar esse tipo de político.
Ora, os políticos que conduzirão os destinos do Brasil nos próximos anos serão eleitos, e não sorteados. Essa eleição, como todas as anteriores, terá aportes financeiros expressivos. Ninguém duvida de que a maior parcela desses aportes sairá dos empresários.
Mas gostaria de dirigir-me aqui especialmente aos milhões de empresários que nas campanhas políticas anteriores não fizeram nenhum tipo de contribuição.
Quero dizer aqui, para esses meus colegas, que, dos poucos empresários que se engajaram, a grande maioria infelizmente sempre ajudou a eleger os políticos que nos encantavam com um discurso maravilhoso –Collor, por exemplo, se fez conhecido como "caçador de marajás". Posteriormente, esses políticos pioraram a condição social, ao mesmo tempo que tentaram sepultar a ética na política.
Proponho a esses milhões de empresários que não fiquem mais uma vez à margem do processo e se engajem nas eleições de outubro. Primeiro, procurem conhecer todos os candidatos. Formulem seus juízos não apenas pelos belos discursos de intenções. Conversem com as suas famílias, com os trabalhadores das suas empresas, sobre esses candidatos. Investiguem se o passado do candidato é honesto.
Não se deixem seduzir pelos discursos. Confiram se, efetivamente, aquele candidato que se apresenta como o campeão da honestidade e da moralidade imprimiu essas características em mandato anterior exercido como vereador, deputado, prefeito ou governador.
Um roteiro interessante seria questionar as propostas dos candidatos do ponto de vista empresarial, para saber se irão beneficiar toda a sociedade e não apenas um segmento. Discutam, por exemplo, se o candidato tem propostas para a geração de emprego, de forma a diminuir a violência e aumentar o mercado de consumidores.
Ou se ele dispõe de planos para a educação que poderão beneficiar toda a população e resultar em trabalhadores melhor qualificados para as empresas. Ou ainda se ele concebeu um programa consistente para melhorar a distribuição de renda de maneira a fortalecer o mercado interno e principalmente aumentar a qualidade de vida. E, principalmente, se ele tem compromisso real com seu programa.
Depois dessa análise, vale à pena optar por um candidato e não se omitir mais uma vez. Tendo optado conscienciosamente por uma das campanhas, aí sim o empresário deve participar ativamente do processo, com idéias e com aportes financeiros que agora são possíveis graças ao aperfeiçoamento da legislação sobre contribuições às campanhas eleitorais.
Entretanto, se todos esses milhões de empresários continuarem se omitindo, a maioria daqueles que costumeiramente se engajam acabará optando pelos salvadores da pátria de plantão. Aqueles mesmos políticos de sempre receberão os aportes financeiros dos empresários de sempre. Nossa omissão poderá custar mais quatro anos de ausência de um desenvolvimento sustentado e a manutenção de 70 milhões de marginalizados.

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