São Paulo, sexta-feira, 8 de abril de 1994
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Greenaway toma Genebra de assalto

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Decepcionado com o universo do cinema, Peter Greenaway empenha-se agora em forjar fora das telas um mundo-cinema. No próximo dia 23, o diretor britânico inaugura em Genebra, Suíça, a megainstalação "Stairs" (Degraus) que ocupa cem lugares na cidade durante uma centena de dias.
Será a primeira de uma série de dez superinstalações metropolitanas que Greenaway agendou para os próximos oito anos, cada qual lidando com um elemento da arte cinematográfica, como a locação, o quadro e a platéia. De Londres, Peter Greenaway concedeu à Folha, por fax, a entrevista exclusiva resumida abaixo. Detalhou o que veremos em Genebra e nas próximas instalações e comentou a sequência de sua carreira como diretor de cinema.
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Folha – Como nasceu "Stairs"?
Peter Greenaway – A idéia manifestou-se originalmente como um roteiro de cinema, nascido no set de filmagem de "A Barriga do Arquiteto" em Roma em 86. Queria recuperar uma ópera perdida de Verdi, "O Casamento de Eneas", e uma pintura barroca de Pozzo – "A Ascensão de Cristo" –visando no processo examinar questões como o pastiche, o restauro, a falsificação e o "trompe l'oeil" da pintura e do cinema. O filme inteiro aconteceria numa grande escadaria.
O roteiro era infilmável. Ele me fez pensar seriamente sobre a linguagem fílmica, a desilusão com o cinema e a sua estreiteza para cobrir satisfatoriamente o alcance da imaginação humana. Pensei então que deveria enfrentar esse assunto por partes, não como um filme mas sim como uma série de dez exposições em oito anos lidando em ordem com locação, o quadro, interpretação, propriedades, tempo, escala, texto, luz e ilusão.
Folha – Onde serão estas exposições?
Greenaway – As três primeiras foram planejadas para Genebra, Munique e Barcelona. A quarta está em estudos em Varsóvia e a quinta em Tóquio. Há planos e convites ainda não sincronizados para realizar as outras cinco em Roma, Sidney, Hong Kong, Pequim e Nova York.
Folha – O que veremos em Genebra?
Greenaway – Cem escadarias estão sendo construidas em Genebra. Elas terão visores. São instalações destinadas a enquadrar. Alguns quadros serão turisticos, mostrando lugares que todo mundo conhece.
Haverá ainda uma exposição no Museu de Arte e História de História de Genebra sobre a questão do quadro e a audiência, contendo capacetes e bustos dos museus da cidade e cerca de 50 pinturas minha relacionadas com o tema.
Folha – Quanto tempo será necessário para visitar toda a instalação?
Greenaway – Acho que 98 dos lugares podem ser vistos em um dia. Mas um deles fica a 40 quilômetros da cidade, na montanhas onde nasce o Reno, e há outra a 400 quilometros onde o Reno desemboca no Mediterrâneo.
Folha – Como serão as instalações seguintes em Munique e Barcelona?
Greenaway – Em Munique, no fim de 95, durante a celebração do centenário do cinema, cem telas de projeção serão espalhadas pela cidade, em edificios, igrejas, escritórios, postos de gasolina, museus, fábricas. Cada tela vai representar um ano do cinema e será construída de forma a ser visível de dia e iluminada à noite e por um jogo de luzes associado à arte da projeção.
Já em Barcelona, em 96, pretendemos construir platéias com mil lugares em mais de 200 endereços da cidade para que um público sempre renovado assista a um "filme" de cem dias –aquele representado pelo mutante meio que nos cerca visto como performance.

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