São Paulo, sábado, 16 de abril de 1994
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Brasileiros criam novo modelo de evolução

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Um casal de físicos brasileiros, José Eduardo Hornos, 41, e Yvone Hornos, 38, misturou matemática com biologia e criou um modelo revolucionário para explicar uma etapa da evolução da vida.
O casal explica como a quebra de uma "harmonia natural" –ou "simetria"– presente nos genes pode ter propiciado a evolução das espécies.
O trabalho dos dois foi publicado em dezembro passado na mais importante revista científica de física do planeta, a "Physical Review Letters", e comentado elogiosamente na mais tradicional publicação científica multidisciplinar, a "Nature", pelo seu editor, John Maddox.
O casal de brasileiros estudou o DNA –substância que contém o código genético– e o RNA –substância que atua como "ponte" entre o código genético e as proteínas que os genes codificam.
São as proteínas que exercem quase todas as funções no ser vivo (elas formam desde membranas celulares a enzimas e anticorpos).
"Nós analisamos o código genético como um processo regido por uma simetria original que vai se quebrando paulatinamente em várias fases. A vida começa simétrica, e durante sua evolução vai perdendo parte da simetria", declara José Eduardo, professor do Instituto de Física e Química de São Carlos da Universidade de São Paulo, onde sua mulher trabalhava até recentemente.
A molécula de DNA vem na forma de dupla hélice e serve tanto para bactérias, hortênsias ou seres humanos.
Ela se baseia num alfabeto de apenas quatro "letras". As letras são A (adenina), G (guanina), C (citosina) e T (timina).
Para formar uma proteína, essas letras são traduzidas para a linguagem do RNA (a "ponte"). A diferença é que, nesse idioma, as letras T são trocadas por U (uracila).
Todas as "palavras" no código genético têm três letras. As palavras são chamadas de "códons" (unidade de código).
Essas palavras de DNA vão buscar os aminoácidos, as unidades que formam as proteínas.
A combinação dessas quatro letras, em palavras de três delas, permite 64 "palavras" (os códons) diferentes. Mas na natureza existem apenas vinte aminoácidos, criando uma redundância grande no código.
Várias dessas palavras genéticas resultam no mesmo aminoácido.
José Eduardo e Yvone argumentam que esse número decorre de uma quebra de "simetria", a harmonia entre as partes ou propriedades de algo (como um ser vivo ou o próprio código genético) que a natureza costuma preferir.
"O código é feio, não tem simetria", diz ele.
Para o casal de físicos, a vida na Terra, em uma etapa primitiva, se arranjava com apenas seis aminoácidos, o primeiro passo na sua evolução até os vinte atuais.
Os dois usaram uma teoria matemática, a "teoria dos grupos", que explica as transformações na simetria, em uma série de mudanças que mostram como a evolução biológica poderia ter acontecido.
Saber se de fato a vida no planeta se comportou desse jeito é algo que vai demandar experimentos de laboratório.
Para não só fazer essas experiências, mas mesmo para sequer imaginar como executá-las, físicos e biólogos vão ter de sentar juntos.
"Apenas trabalho de laboratório pode decidir o que realmente aconteceu. Isso permanece um desafio", resumiu a questão, em seu comentário na "Nature", o também físico John Maddox.

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