São Paulo, segunda-feira, 18 de abril de 1994
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Qualidade ao alcance de todos

ARNALDO PEREIRA RIBEIRO

O cidadão brasileiro vai, aos poucos, se apercebendo de certas mudanças. Para melhor, é claro. Refiro-me à questão da qualidade de produtos e serviços que, ainda para a maioria das pessoas, guarda forte vinculação com o preço. "Para receber qualidade é preciso pagar mais caro" é uma afirmativa que tenho ouvido com bastante frequência. Entretanto, tenho rebatido, informando que qualidade é um direito do cidadão. Direito este que se concretiza na troca do dinheiro pago pelo consumidor por um produto ou serviço. Assim é que, em qualquer compra, o consumidor deve se sentir plenamente satisfeito.
Ainda somos expostos, com bastante frequência, às chamadas promoções. Algumas delas são capazes de atrair muita gente preocupada em fazer o seu minguado salário render o máximo possível no supermercado. A inflação galopa, como todos sabemos, e comprar produtos em promoção, algumas vezes conduz o cidadão desavisado a levar para casa alimentos com prazo vencido e qualidade duvisosa.
Uma parcela desses consumidores enganados é capaz de retornar ao estabelecimento e exigir seus direitos, recenbendo de volta o seu dinheiro ou conseguindo a troca do produto. Em pouquíssimas vezes, os reclamantes receberão também um pedido de desculpas e, com certeza, nunca receberão uma compensação pelo inconveniente.
Na minha opinião, boa parte da atitude ainda passiva do consumidor brasileiro tem explicação na falta de informação. E é justamente por aí que mudança maior começa a se processar. Vejos porque:
a) a abertura do mercado a produtos estrangeiros tem contribuído para educar o consumidor que percebe as diferenças existentes com relação aos similares nacionais como, por exemplo, as informações presentes nas embalagens (mais ricas no produto importado);
b) o Código de Defesa do Consumidor vem tendo sua divulgação cada vez mais ampliada em todo o país por entidades de proteção aos consumidores, levando ao cidadão o esclarecimento necessário à reivindicação de seus direitos;
c) a atuação cada vez mais ampla de organismos como o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), os Procons e os Institutos de Pesos e Medidas, que são instrumentos muito fortes à disposição da população como recorrência contra a ação de comerciantes desonestos.
No que diz respeito à qualidade dos serviços que recebe em troca do seu dinheiro, o cidadão brasileiro também começa a ser mais respeitado. A preocupaçào de grande parte do comércio de serviços, especialmente as franquias, tem sido o treinamento dos funcionários na arte de atender seus clientes com cortesia. A razão dessa preocupação é óbvia: no mercado altamente competitivo dos dias de hoje, O fundamental é garantir a plena satisfação do cliente, agradá-lo ao máximo, para fazer com que ele volte muitas vezes.
Está havendo uma espécie de campanha de educação para o consumo e é sempre bom lembrar que o consumidor esclarecido e atuante exerce gratuita e eficazmente o papel de verificador dos padrões de qualidade. O consumidor exigente torna-se a alavanca e o motor nesse processo de melhoria contínua da qualidade.
Assim é que a percepção de todas estas coisas vai provocando no consumidor a desmistificação do conceito de qualidade. O cidadão já começa a entender que qualidade é um direito que lhe assiste e pelo qual ele não precisa pagar nenhum centavo a mais.
No momento em que o tema qualidade passou a ser objeto de um fascículo especial da Folha de São Paulo, atingimos uma etapa de grande relevância neste processo de mudança: trata-se da popularização do tema, coisa com que nem sequer sonhavam os maiores especialistas no assunto, vinte anos atrás, quando comecei minhas primeiras leituras de Deming e Juran.
A qualidade deixou de ser uma atividade exclusiva de alguns dirigentes preocupados com a sobrevivência de suas empresas e passou a ser um objetivo social. Passou a ser uma corrida necessária e imperiosa para a melhoria da vida do brasileiro. Passou a ser um exercício de cidadania.
Somos todos consumidores e temos que deixar de lado o imobilismo e a cumplicidade com o desserviço, o desperdício, a falta de qualidade. Temos o direito e o dever coletivo de melhorarmos a nossa qualidade de vida. Moramos no Brasil, um país como poucos mas que ainda precisa ser mudado. Agora já podemos fazer isso porque hoje a qualidade está ao alcance de todos.

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