São Paulo, quinta-feira, 21 de abril de 1994
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Privatização, petroquímica e tecnologia

ROGÉRIO H. QUINTELLA

A petroquímica brasileira passa por uma encruzilhada histórica. Muito se discutiu sobre como privatizá-la, quase toda a análise foi porém centrada nos aspectos legais e institucionais. Pouco se discutiu sob o ponto de vista das estratégias tecnológicas, subestimando-se o fato de que a petroquímica é um setor intensivo não apenas em capital, mas também em tecnologia.
Pode-se dizer que a evolução deste segmento industrial no Brasil passou por três fases: implantação (1950/68), expansão (1968/88) e racionalização (a partir de 1988).
Na primeira fase as unidades produtoras eram tipicamente subsidiárias de empresas multinacionais. A capacitação do país era muitíssimo reduzida, estima-se que o índice de nacionalização (termo hoje já fora das "hit parades") de equipamentos nas unidades construídas nesta fase não tenha atingido 40%.
O ano de 1968 trouxe a criação da Petroquisa e da PQU. A partir das matérias primas fornecidas pela PQU formaram-se algumas empresas de segunda geração, pioneiras na utilização do modelo "tripartite". A inovação administrativa representada por esta estrutura de capital teve sucesso ao viabilizar a formação das empresas dos pólos de Camaçari e Triunfo.
Em termos de know-how de engenharia e equipamentos observou-se um crescimento firme com índices de nacionalização cada vez maiores (60% no pólo de São Paulo, 75% no de Camaçari e 90% em Triunfo). Ao fim deste período as empresas de engenharia já detinham capacitação para execução de serviços não apenas de detalhamento, mas também de engenharia básica.
O modelo tripartite representou uma estratégia governamental de sucesso, mas amarrou o desenvolvimento das companhias. As empresas não tinham massa crítica para desenvolvimentos tecnológicos mais significativos ou mesmo para um crescimento sustentado de seus portifólios de negócios. Ao fim do período tinham porém uma capacitação básica capaz de lhes garantir uma produção típica de 30% acima de suas capacidades nominais.
De forma a driblar as limitações ao desenvolvimento as empresas de Camaçari investiram durante anos em uma espécie de "consórcio tecnológico". O resultado de tal esforço no entanto foi frustrante. Os adversários de tal "consórcio" sempre argumentaram ser impossível coordenar os interesses e a confidencialidade da tecnologia de cada um dos participantes. (Tal argumentação cai por terra ao se observar que, no final da década de 30, um consórcio semelhante formado por empresas tão antagônicas quanto Exxon, Shell, BP, Texaco e outras, teve sucesso ao desenvolver um processo catalítico de craqueamento de petróleo).
Ao final deste período a Petroquisa acordou para a premente necessidade de massa crítica para o desenvolvimento tecnológico e chegou mesmo a fomentar a formação "em massa" de pesquisadores de alto gabarito. Tal decisão surgiu porém já no início da derrocada da tecno-burocracia estatal, resultando no abandono do projeto. Independentemente deste novo fracasso vale ressaltar que ao final do período, o país contava já com alguns centros de excelência no ensino e na pesquisa da engenharia química e da catálise.
Com a redução das proteções alfandegárias as empresas entraram na pior fase de sua curta história. Corroborando com a crise brasileira, a indústria química mundial entrou em um de seus cíclicos "dowturns". A redução de custos passou pela redução de pessoal e pela fusão das empresas, atingindo fortemente os quadros de P&D).
Paralelamente iniciou-se a redução da participação do Estado no setor. Tal processo está atualmente dando uma sobrevida a maioria das unidades produtoras. Uma vez atingido um novo "upturn", o setor estará a salvo por outros seis a oito anos. Até lá o processo de privatização associado a fusão das empresas terá gerado empresas petroquímicas de maior porte.
Os controladores destes "novos grandes grupos" não podem porém se iludir, as oportunidades têm de ser aproveitadas. Sem a elaboração e execução de uma competente estratégia tecnológica (associada às estratégias de cada unidade de negócios), a sobrevida do setor corre o risco de não ir além do próximo "downturn" da indústria mundial.

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