São Paulo, sexta-feira, 22 de abril de 1994
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Comunicação e o sucesso dos planos econômicos

CARLOS ANTONIO LUQUE

Além de sua capacidade em atacar as causas básicas do processo inflacionário, o sucesso de um plano depende de como suas medidas, o impacto de determinadas ações, são transmitidos para todos nós.
Superestimar os resultados de determinadas ações, acreditar que o plano consiga abordar todos os inúmeros aspectos que determinam o processo inflacionário, não perceber que ocorrências imprevisíveis podem alterar o rumo dos acontecimentos, etc. geram um distanciamento entre o discurso da equipe econômica e a percepção que toda sociedade faz sobre o plano e a realidade econômica.
Uma pergunta tradicional que surge quando da adoção de um determinado plano econômico refere-se à questão mais ampla de se ele dará certo, e por dar certo, entendemos de maneira geral, se haverá inflação após a introdução da nova moeda.
Certamnte após a introdução do real haverá inflação. E a ocorrência desse fato não representa necessariamente um fracasso do plano, mas, sim, que com a redução do processo inflacionário –obtida pela própria introdução da nova moeda– determinadas camadas da população serão beneficiadas e consequentemente haverá um aumento na demanda por bens e isso se traduzirá em elevações de preços.
Entretanto, para que interpretemos a ocorrência dessa elevação de preços como um fenômeno natural e não como fracasso do plano, é fundamental que a equipe econômica transmita estes fatos da melhor forma possível.
Tomemos um outro exemplo, representado pela questão das perdas salariais.A convesão dos salários reais pela média dos últimos quatro meses representa também uma medida tradicional nos planos econômicos. Em princípio, por definição, ela mantém o poder de compra médio dos trabalhadores durante os últimos quatro meses. Nesse sentido, não haveriam perdas para os trabalhadores. Portanto, a equipe econômica deve defender e explicar esta forma de conversão.
Por outro lado, é não menos importante reconhecer que a aceleração recente do processo inflacionário está deteriorando os salários reais dos trabalhadores, mesmo que o salário em URVs esteja fixado. Nesse sentido, a proposta para o cálculo das perdas deveria se basear no processo de aceleração do processo inflacionário, com o objetivo de se garantir o próprio espírito do plano, ou seja, manter uma certa média de poder de compra para os trabalhadores.
Entretanto, tradicionalmente, as equipes econômicas tem ímpetos fortes na direção de afirmar de que não haverá inflação após a adoção de um plano, de que os salários não estão caindo, enfim, de que não há problemas.
Este tipo de comportamento reflete inúmeros aspectos. De um lado, o árduo desejo que as equipes econômicas possuem para que o plano dê certo. E quanto maior o desejo maior a dificuldade que se tem para se perceber adequadamente determinados problemas; além do fato de que sempre existe uma certa tendência de se superestimar o próprio alcance das medidas tomadas.
Por outro lado, a necessidade de se desindexar a economia e induzir os agentes econômicos a estabelecerem contratos sem cláusulas de indexação, ou apenas concedendo reajustes após um ano, também direciona o discurso no sentido de que para que isso ocorra é fundamental que a inflação seja muito baixa após a introdução da nova moeda.
Assim, quando a inflação ressurge, todos nós interpretamos este episódio como representando o fracasso do plano, caso a equipe tenha dito de que não haveria inflação.
O exemplo do Plano Collor 1 é marcante. A inflação de março de 1990 era superior a 80%, diminuindo para algo como 4% em abril.
Esse resultado que deveria ter sido interpretado como um sucesso, representou o primeiro fracasso do plano, em virtude de que a ex-ministra Zélia Cardoso de Mello havia estabelecido como meta, a famosa inflação zero.
É claro que o fracasso não se deveu apenas a esse fato, mas certamente esse episódio reduziu em muito a confiança dos agentes econômicos contribuindo para que o plano não produzisse os resultados desejados.
É portanto de vital importância que a comunicação dos responsáveis pela condução da política econômica junto à sociedade seja muito clara e transparente a respeito dos fatos que vão se desenvolvendo, a fim de se evitar o distanciamento entre o discurso oficial e a percepção que os agentes econômicos sentem no seu dia-a-dia, que certamente o relevam os verdadeiros efeitos dos planos econômicos.

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