São Paulo, sábado, 23 de abril de 1994
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Godard inventa o futuro na fria 'Alphaville'

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Filme: Alphaville
Produção: França, 1965, 98 min.
Direção: Jean-Luc Godard
Canal: Cultura, 23h20.

A pior maneira de abordar "Alphaville" é por seu conteúdo explícito. A idéia de um futuro onde tudo é frieza e os computadores ordenam uma existência humana desprovida de sentimentos é, para dizer o mínimo, datada.
Mas a aventura do agente secreto Lemmy Caution (Eddie Constantine), que vai aos "planetas exteriores" em busca do professor von Braun, tendo como guia a filha deste, Natacha (Anna Karina), tem outros encantos, e não são poucos.
O primeiro, e mais persistente, diz respeito à concepção de futuro. Em vez de queimar fortunas com cenários exdrúxulos, Godard filmou, pura e simplesmente, Paris. Com a luz de Raoul Coutard, porém, a cidade transfigura-se. Os ângulos escolhidos a dedo criam um ambiente de estranhamento absoluto, sem que se gastasse um centavo em cenografia.
Mesmo Alpha-60, o célebre cérebro eletrônico que controla tudo e todos, não é mais que um ventilador. Essa possibilidade do cinema, de transfigurar a realidade, é o que Godard explora em seu filme. Com uma vantagem: como não investe em previsões sobre o futuro e suas engenhocas, "Alphaville" já beira os 30 anos de idade sem qualquer risco de se ver ultrapassado.
O futuro é apenas um quadro onde, a rigor, exacerbam-se certas preocupações do diretor na época. A central diz respeito à proibição de uma frase "Eu te amo". O tempo passou, muitas coisas mudaram, mas essa continua sendo uma expressão complicada. "Alphaville", um dos filmes mais simples e lineares de Godard, continua inteiro e notável. E suas imagens são de uma limpidez rara.
(Inácio Araujo)

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