São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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Financeiras já temem a inflação em real

EDUARDO BELODA REPORTAGEM LOCAL
DA REPORTAGEM LOCAL

A inflação em real preocupa as financeiras. Empresas de crédito temem que os 3,5% a 5% de juros ao mês cobrados hoje nos empréstimos em URV sejam insuficientes quando a nova moeda chegar.
Esse temor mostra que as financeiras não acreditam que a inflação se aproxime de zero com o surgimento do real. Se 5% não são suficientes, é que as empresas esperam inflação de pelo menos 4%.
O risco é maior nos contratos de longo prazo. Neles, o empréstimo será pago a maior parte do tempo sob a vigência do real.
Os juros não poderão ser alterados. Se a inflação ficar alta, quem emprestou perde. A previsão extra-oficial do governo para a inflação em URV este mês é de 3%.
A diretoria da Associação das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), que reúne as financeiras, debateu o tema na semana passada.
Segundo a Acrefi, parte das financeiras já está incluindo nos contratos de crédito em URV uma cláusula que permita a mudança de índice na correção do pagamento.
A intenção é evitar perdas com a eventual taxa de inflação na nova moeda. Representantes do setor estão sugerindo ao governo que acate essas cláusulas.
A decisão das financeiras pode causar problemas na Justiça. A medida provisória 457, que cria a URV, estabelece que contratos nesse indexador só podem ser reajustados depois de um ano.
Para se previnir, alguns bancos comerciais só emprestam em URV com prazo máximo de 35 dias. É que o governo já avisou que a introdução real será anunciada com antecedência mínima de 35 dias.
Dessa forma, os bancos se abrigam de qualquer variação de preços na nova moeda.
Quando conhecerem a data em que o real passa a vigorar, podem suspender os empréstimos em URV e esperar para ver como fica a variação de preços e juros.
Captação
Nem mesmo a captação de dinheiro em URV deve mudar o quadro, na avaliação da Acrefi.
O presidente da entidade, Alkindar de Toledo Ramos, acha que a situação só melhoraria se o setor conseguisse compatibilizar prazos.
Em outras palavras, as financeiras querem aplicações de prazo mais longo, mais próximo da duração dos empréstimos. Isso representaria, por exemplo, a volta da caderneta de poupança trimestral.
Hoje as instituições emprestam por prazos variados e captam quase sempre por 30 dias. Num empréstimo por três meses, há uma diferença de pelo menos 60 dias.
Nesse período a operação pode ficar "descasada". Se os juros subirem, as empresas terão que pagar mais para quem aplica o dinheiro e não poderão cobrar a diferença do tomador do empréstimo. Se os juros caírem, elas saem ganhando.
O presidente da Acrefi defende que a caderneta de poupança também possa ser captada em URV. Ele acredita que a caderneta, a aplicação mais popular, poderia atrair interesse para a URV.
Por enquanto, o governo dá sinais de que só os Certificados de Depósito Bancário (CDBs) serão captados em URV. Na quinta-feira, o ministro da Fazenda, Rubens Ricupero, disse que a caderneta em URV vai demorar.
A caderneta em URV pode representar alguns problemas. Em primeiro lugar, a caderneta patrocina obras do Sistema Financeiro da Habitação. A ela estão atrelados financiamentos da casa própria.
Em segundo lugar, a poupança hoje é corrigida pela Taxa Referencial (TR). A TR se baseia nos juros do mercado. Em URV, a poupança renderia apenas 0,5% ao mês depois da criação do real.
A Associação Brasileira das Empresas de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) entende que, em URV, o dinheiro disponível para o setor será menor.
A correção seria também menor, ao contrário do que o governo deseja. A equipe econômica quer juros altos para evitar uma corrida ao consumo. Ela prejudicaria o controle da inflação.
Além disso, o poupador pode perder o interesse pela caderneta se o rendimento for menor. O risco passa a ser de fuga das aplicações para o consumo.

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