São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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Jornalista não é avestruz

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Não tinha a intenção de comentar hoje, de novo, o elogio de Lula a Adolf Hitler, numa entrevista à revista "Playboy" em 1979. Mas, ao chegar ontem na sucursal, recebi pelo fax protestos irados, alguns deles transmitidos através de nossa ombudsman. Sou acusado de fazer campanha contra o PT.
Reli a coluna publicada na sexta-feira, motivo dos protestos. Insisto: está no tom certo. Lembrei que Lula tinha feito ressalvas antes de elogiar Hitler. Mais: escrevi que não o acusaria de anti-semita.
Atribuí a frase à ignorância do então líder sindical, duvidando que, agora, ele a repetisse. Ponderei que, deste então, ele evoluiu. Difícil entender esses militantes petistas, tão ávidos em atacar os inimigos e irritadiços quando se levanta qualquer coisa, mesmo justa, sobre Lula.
Vejamos: quando deu a entrevista, Lula tinha 34 anos. Será que não é relevante os eleitores saberem que um provável futuro presidente do Brasil elogiou Hitler, quando já era adulto?
Será que alguém tem medo de que os eleitores conheçam o perfil de um candidato? Pretende-se reescrever a história como os ditadores de "esquerda" ou "direita"? Esse tipo de reação apenas reforça a suspeita de que alas do PT ainda não se acostumaram com a democracia.
Fico imaginando se a frase elogiando Hitler fosse proferida por Paulo Maluf, Orestes Quércia ou Antônio Carlos Magalhães. Duvido (repito, duvido) que o PT não a usasse nas campanhas eleitorais e, aí, sem fazer qualquer ressalva.
Aviso aos militantes: podem berrar à vontade. Meu compromisso é apenas com o leitor: esta coluna não vai poupar nenhum dos candidatos. Tenho a obrigação de abordar criticamente tanto a aliança PT-PC do B e PSBD-PFL como o jogo baixo de Orestes Quércia com seus dossiês.
PS – A propósito da polêmica, em contato ontem com esta coluna, o professor Bolívar Lamounier, um dos mais respeitados intelectuais brasileiros, analisou: "Numa democracia sólida como Estados Unidos, Inglaterra ou França, um candidato que, no passado, tivesse elogiado Hitler, estaria acabado politicamente". Antes que voltem a me acusar de facciosismo, lembro que o "PS" de ontem foi ocupado por José Genoíno, que defendeu Lula.

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