São Paulo, terça-feira, 26 de abril de 1994
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Inéditos de Cortázar são publicados

MARCO CHIARETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

A editora espanhola Alfaguara acaba de lançar cinco livros com obras do escritor Julio Cortázar (1914 - 1984). Há vários textos inéditos.
A edição foi organizada em dois volumes de contos ("Cuentos Completos") e três de ensaios críticos.
O ensaio "Teoría del Túnel" foi escrito em 1947. Nunca foi publicado. Trata do romance, uma forma literária à qual Cortázar só se dedicaria a partir de 1960, quando saiu "Os Prêmios".
"Teoria" está no volume 1 da "Obra Crítica", cuja edição foi cuidada pelo crítico Saúl Yurkievich, um dos maiores especialistas mundiais na obra do autor de "Rayuela" (publicado no Brasil com o título de "O Jogo da Amarelinha").
O curador nota que o ensaio é um dos mais evidentes exemplos da reunião, em Cortázar, de duas correntes intelectuais do século 20: o surrealismo e o existencialismo. O subtítulo do ensaio diz: "Notas para uma localização do surrealismo e do existencialismo".
Como Cortázar era professor universitário pouco antes de escrever o ensaio, e ensinava literatura francesa, Yurkievich imagina que o texto possa ter sido escrito a partir de suas notas de aula.
Não há no ensaio nada que confirme (ou não) esta idéia. Em 1947, o autor já trabalhava na Câmara Argentina do Livro, em Buenos Aires, e já deixara de ser professor, insatisfeito com os caminhos políticos da Argentina, na época governada pelo general Juan Domingo Perón.
Contos
Os dois volumes de ficção reúnem todos os relatos curtos escritos por Cortázar. Começa com o também inédito "La Otra Orilla" (A Outra Margem), um conjunto de 13 contos organizados em três partes: "Plagios y traducciones", "Historias de Gabriel Medrano" e "Prolegómenos a la Astronomía". O livro foi completado em 1945. Está dedicado a Paco, "que gostava destes relatos".
"Bestiário", primeiro livro assinado por Cortázar e publicado em 1951, também está dedicado a Paco ("que gostava dos meus relatos", grifo meu). Alguns dos contos de "La Otra Orilla" reaparecem em "Bestiário", com modificações.
Cortázar, que era, como salienta o escritor Mario Vargas Llosa no prefácio do primeiro volume de contos, um experimentador convicto, um brincalhão dedicado às palavras, gostava de mudar seus textos.
"O jogo", como o romance e o teatro, diz Vargas Llosa, é, para Cortázar, "uma forma de ficção, uma ordem artifical imposta sobre o mundo, uma representação de algo ilusório, que substitui a vida".
Um dos grandes exemplos desta recriação é outro conto, incluído em "Alguém que Anda por aí": "A Barca ou Nova Visita a Veneza". Cortázar diz em um preâmbulo que escrevera o conto em 1954, em uma visita à cidade italiana, e que o guardara com uma nota dizendo que gostava do conto, mas que era muito ruim.
A reescritura inclui no próprio texto comentários escritos por um dos personagens, Dora, corrosivos de tão críticos com o texto.
"Desde jovem", diz o autor no preâmbulo, "tentou-me a idéia de reescrever textos literários que me haviam comovido, mas cuja execução parecia-me inferior às suas possibilidades internas".
A leitura de seus contos completos e de seus ensaios críticos mostra como esta foi realmente a preocupação de sua vida: a busca da perfeição, sem perder a "comoção", a afeição pela obra. É como se o mote de "Che" Guevara, o revolucionário argentino-cubano, fosse aplicado às palavras.

Título: "Obra Crítica" (três volumes) e "Cuentos Completos" (dois volumes), de Julio Cortázar
Quanto: O volume 1 da "Obra Crítica" custa 16 pesos, e os outros dois, 24 pesos cada um; os dois volumes de "Cuentos Completos" custam 29 pesos cada um
Onde: Os livros podem ser encomendados à Livraria Letraviva (av. Rebouças, 2.080, zona oeste de São Paulo, tel. 011/280-7992); o peso-livro vale CR$ 3.300

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