São Paulo, quarta-feira, 27 de abril de 1994 |
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É hora de cumprir a Constituição
HÉLIO BICUDO À medida que os grandes grupos econômicos nacionais e internacionais não conseguem, não obstante os "lobbies" acionados no chamado Congresso revisor, implementar as modificações no atual texto constitucional, para adequá-lo ao neoliberalismo, começam a despontar apelos para que se adie o presente processo, aliás, ilegitimamente iniciado, para o próximo ano, ou, então, que se parta para a eleição de uma Constituinte exclusiva, da qual não possam participar deputados e senadores eleitos ou militantes de partidos político.É de pasmar que semelhante linha de pensamento esteja sendo defendida até mesmo por intelectuais e jornalistas que se dizem progressistas ou mesmo de esquerda. Em primeiro lugar, a convocação de uma Assembléia Constituinte se constitui no desaguadouro de uma ruptura institucional. Essa ruptura, como pretendem alguns, não precisa qualificar-se como a resultante de um ato de força, de uma guerra civil –não precisa haver sangue. No caso brasileiro, essa ruptura ocorreu, a partir dos movimentos populares que buscaram a anistia para os presos e perseguidos pela ditadura militar, que se derramaram no magnífico espetáculo das Diretas-Já e que, por fim, determinaram a saída dos militares, instaurando-se os primeiros governos civis, quando se estabeleceram as novas regras comuns que deveriam reger a sociedade brasileira. Hoje, há que se cumprir a Constituição. Se defeitos possam ser encontrados –e eles existem–, as alterações podem e devem ser feitas no processo previsto pela própria Lei Magna, através de emendas amadurecidas com a participação dos vários segmentos da sociedade civil e não por um colégio elitista, cujos membros serão eleitos segundo a vontade dessas mesmas elites que, ante o perigo de se verem apeadas do poder, pretendem mediante esse golpe institucional nele permanecer. Na realidade, a Constituição não é o fim de um processo, mas a porta aberta para a construção de um Estado democrático de Direito. A democracia não se impõe, mas se constrói, e se constrói através da vontade popular e não dos membros de um colégio que será eleito para resguardar a posição dos mesmos grupos econômicos e intelectuais que dificultam e até mesmo impedem que uma nova sociedade seja modelada, segundo os verdadeiros interesses populares. É tempo de pormos um fim a essas idéias que buscam confundir, em vez de encontrar soluções. A solução para o Brasil é cumprir a Constituição e, sendo o caso, aperfeiçoá-la em comunhão com os verdadeiros interesses populares. O que falta ao nosso país não são leis, que as temos até em fartura. O que falta é vontade política para cumpri-las e fazê-las cumprir. Texto Anterior: Perversão verbal; Salário, o mínimo; Abraço pernambucano; Banco do Brasil e a inflação; Caderno da Bienal; Mulheres e as Diretas; Questão indígena; Jardim Botânico Índice |
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