São Paulo, quinta-feira, 28 de abril de 1994
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Lixo de Calvin Klein esconde segredos

DAVID DREW ZINGG

Em Nova YorkNunca se deve falar mal dos mortos, mas sou obrigado pela história a abrir uma exceção. Richard Nixon, 37º presidente da Gringolândia, morreu na semana passada de um derrame cerebral maciço. Apesar de um esforço igualmente maciço de sua parte para reescrever sua própria história, Nixon morreu como um político desonrado.
Nixon compartilhava com outro presidente –Fernando Collor– o gosto pelas coisas mais baixas da vida. Ambos foram indicados para o impeachment por seus respectivos Congressos, mas Nixon escapou da indignidade final ao renunciar em tempo. Ambos presidentes foram pioneiros no mau uso do poder político maligno da televisão.
O americano certa vez salvou sua vida política fazendo um discurso sobre seu cocker spaniel de estimação, "checkers", que poderia lhe haver garantido um emprego bem pago escrevendo telenovelas para nosso colega jornalista, dr. Roberto Marinho.
Acredita-se que Fernando Collor tenha ganho sua eleição atirando uma namorada extraconjugal na cara de Lula, num debate crucial na TV Globo.
Tem havido uma profunda confusão sobre os mecanismos políticos para se fazer o bem social em nossa época. Nixon ajudou a inventar a tática de chamar de "comunistas" as pessoas que queriam trazer necessárias transformações sociais para uma sociedade aberta e democrática. Ele inventou, e o senador Joseph McCarthy aperfeiçoou, as horas sombrias da temível "caça às bruxas" na Gringolândia.
A carreira de Nixon começou e terminou com uma série de truques sujos. Ele descreveu sua primeira oponente, uma senhora, como sendo "cor-de-rosa até na roupa de baixo". "Pinko" ("rosadinho") tornou-se sinônimo de "simpatizante comunista". Ele utilizou testemunhos forjados para colocar outro adversário na cadeia por ser "pinko".
Nixon acrescentou o sufixo "gate" à língua inglesa quando mandou agentes clandestinos da Casa Branca arrombarem a sede do Partido Democrata situada num edifício de Washington, chamado Watergate. Suas mentiras e seus acobertamentos posteriores da operação ilegal acabaram por fazê-lo renunciar ao cargo mais poderoso do mundo. Desde o caso Watergate, qualquer grande escândalo passou a ser conhecido como "Escândalogate".
Por uma ironia extrema da vida, o "pinko" que Nixon enviou à prisão, um homem gentil chamado Alger Hiss, comemorou seu 90º aniversário aqui em Manhattan na semana passada, na mesma noite que Nixon sofreu seu derrame fatal. Enquanto Hiss estava sendo homenageado por amigos que lutaram desde a década de 50 para limpar seu nome, Nixon era levado a um hospital a poucas quadras de distância.
Fui convidado por um amigo a participar da recepção para o sobrevivente de 90 anos da primeira ascensão de Nixon ao poder, mas não consegui chegar a Nova York em tempo. Mais tarde, pedi a meu amigo para pedir a Hiss que comentasse a morte de Nixon.
O caso Hiss tornou Nixon famoso. Sem a publicidade decorrente, o obscuro congressista provavelmente jamais teria se tornado presidente dos Estados Unidos.
Hiss está em estado de saúde frágil e quase não enxerga mais. Meu amigo visita-o regularmente para ler novos livros em voz alta para ele. A audição de Hiss também está se deteriorando. Meu amigo lhe perguntou sobre Nixon.
Hiss pensou um pouco e disse: "Não é apropriado para mim fazer qualquer comentário".
"Não vou tripudiar", disse ele. "Não sou homem de me comprazer com a desgraça alheia".
A voz da rolinha

A primavera já chegou aqui na "Big Apple" e, como diz o velho ditado sobre amantes, a voz da rolinha se ouve na terra. Um dos sinais oficiais da chegada da primavera é que Bobby Short vai abrir dentro em breve sua temporada no Café Carlyle. Short canta a versão gringa dos "lieder" alemães –aquelas gloriosas canções de amor clássicas populares dos anos 30. Ele é simplesmente o melhor cantor "saloon" de hoje.
O cheiro da obsessão

Você mede o sucesso de um livro pelo número de exemplares que vende ao público ou pelo fato de que a pessoa que é seu tema oferece US$ 5.000 para tentar impedir que seja publicado? Seja qual for tua resposta, o fato é que o livro em questão, uma biografia não-autorizada chamada "Obsession: The Lives and Times of Calvin Klein" (Obsessão: as vidas e a época de Calvin Klein) está sendo um hit total aqui na Applelândia.
A vida particular extremamente agitada do fashion-designer-perfumista-zilionário, há muito tempo tema de cochichos agitados nos melhores bares gays e não-gays, finalmente foi escancarada para o público no livro que acaba de ser lançado pela Birch Lane Press.
O pessoal que escreveu a obra que arrasa com a imagem de Calvin Klein tem bastante prática nessa arte lasciva. Steve Gaines passou muito tempo examinando o lixo de Klein alguns anos atrás, e sua co-autora, uma certa Sharon Churcher, foi redatora profissional de "gossips" da revista "Penthouse", "The New York Post" e "New York Magazine".
Aqui nos EUA pessoas desse tipo são conhecidas como "muckrakers", ou seja, literalmente, pessoas que esmiuçam lama fedorenta na esperança de encontrarem tesouros perdidos.
Se lama fedorenta te dá prazer, você a encontrará em abundância no livro, um estudo de 396 páginas de aberrações sociais. Algumas das revelações que ele faz:
A primeira namorada de Klein, uma menina de seu bairro, achou bastante estranho que o jovem rapaz, que fabricava bonecas, não se ligasse sexualmente nela.
Klein teve um caso de amor apaixonadíssimo com o colega designer Perry Ellis, que posteriormente morreu de Aids.
A primeira vez que Klein fez amor com sua sua mulher, Kelly, foi depois de ficar sabendo que ela havia anteriormente feito a mesma coisa com Warren Beatty, o astro de cinema com excesso de ambição sexual. Conclusão dos autores: "Era como se ele conseguisse um pedaço de Warren também".
Klein não encontrou dificuldade para oferecer os US$ 5.000 que teria oferecido para comprar o manuscrito.
Um amigo meu com quem eu almoçava no Gino e que costuma observar as normas sociais da Gringolândia comentou: "Klein parece estar sofrendo da nova doença americana, a Síndrome de Deficiência Constrangimental".
Mamãe querida
Imaginem vocês a alegria do tio Dave quando descobriu sua matéria favorita sobre uma Drag Queen Decadente da Grande Maçã do "The New York Times" enfeitando a capa da revista "New York", esta semana.
Você deve se lembrar, Joãozinho, que eu te contei tudo sobre a Drag Queen favorita dos repórteres de Nova York, um homem-mulher de muito brio chamado/a Dorian Corey? Você lembra sim, bobinho. Dorian, um travesti nova-iorquino irônico e que começava a envelhecer, morreu em agosto passado.
Quando seus amigos foram mais tarde à casa de Corey, para organizar e vender seus pertences, ficaram perplexos por um cheiro meio podre que vinha do segundo quarto. Seguindo seu faro, eles desembrulharam um pacote envolto num plástico de cobrir assentos.
Descobriram o corpo mumificado de um homem com um buraco de bala bem no meio da testa. Agora a revista "New York" se arrisca a adivinhar o que talvez tenha acontecido. Segundo a matéria, o corpo pertencia a um ex-namorado do Drag Queen Corey. O amante só queria curtir todas. Aparentemente ele pressionou Corey a se assumir inteiramente e passar por uma cirurgia de mudança de sexo, para que pudessem consumar seu amor à moda antiquada, bíblica e completa.
Corey, que tinha seus próprios limites, objetou. Seguiu-se uma discussão e Corey baleou seu namorado, de modo que revelou ser fatal. Algumas garotas fazem qualquer coisa para defender sua virgindade.
Tradução de Clara Allain

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