São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994
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Biotecnologia é moda entre candidatos

MARCELO LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

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Biotecnologia é moda entre candidatos
O capítulo referente a "ciência e tecnologia" dos incipientes programas de governo parece ter apenas a função de mostrar que o pré-candidato é moderno.
Não há, a rigor, propostas concretas. Ninguém sabe ao certo onde quer chegar, nem com que recursos. O máximo que se pode concluir é que todos ouviram cantar o galo da Eco-92.
Na década de 80, a informática era a vedete da política para o setor. Seu lugar na mitologia esperançosa das tecnologias de ponta está sendo ocupado pela biotecnologia, hoje não mais do que uma promessa de aproveitamento dos tesouros genéticos da floresta.
Genes, não mais os chips, são a pedra filosofal do futuro.
"Ciência dos oceanos"
O primeiro passo para dar com os burro n'água é acreditar que competitividade e competência tenham algo a ver com soberania e auto-suficiência, o que parece estar por trás, por exemplo, do pré-programa do PDT.
Além da fé no poder mágico da indústria microeletrônica, Hésio Cordeiro, coordenador do programa brizolista, tem como prioridade o setor de pesquisa das empresas estatais – uma forma tortuosa de fazer a defesa do monopólio estatal do petróleo e telecomunicações.
O PT de Lula faz, é certo, uma ressalva quanto à hipótese de que o país consiga se tornar competitivo em áreas de fronteira como microeletrônica e genética. Mas inda destaca como prioritários a energia alternativa, a ciência dos oceanos, a engenharia ecológica e a agricultura ecossistêmica.
Boas intenções
Muito pouco se avança, no entanto, no que se poderia chamar de corporificação das boas intenções.
Como diz o físico Ennio Candotti, conselheiro e ex-presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), é preciso discutir e definir o que quer dizer prioridade para o biotecnologia no Amazonas, em Goiás ou no Rio Grande do Sul. Ou ainda, em quais nichos desse setor o país tem chance de se tornar competitivo com pequeno investimento.
O exemplo de Candotti é a reserva de mercado para informática, sobre a qual aliás todos parecem dispostos a fazer uma autocrítica. O Brasil quis desenvolver tudo ao mesmo tempo e ficou para trás, enquanto países como a Coréia se especializaram e hoje dominam segmentos inteiros do mercado mundial de eletrônica.
Em germe, pelo menos, essa preocupação com a identificação de oportunidades tecnológicas pode ser notada em algumas propostas. Curiosamente, é uma das poucas coisas em comum entre arquinimigos como os pré-candidatos peemedebistas Orestes Quércia e Roberto Requião.
Ambos propõem investir em nichos da informática como impressoras (sugestão de Luiz Gonzaga Belluzzo, um dos coordenadores do programa de Quércia) ou software (Requião).
Enquanto não se alcançar esse nível de detalhamento, será difícil falar de programas em sentido forte.
Além das impressoras, Belluzzo cita vários setores específicos como alvo de investimentos, como a automação industrial e termelétricas a gás natural.
Números
Por fim, e a exemplo da predileção pelas biotecnologias, existe unanimidade e pouca clareza em torno de outro fetiche da política tecnológica: todos se mostram inclinados a elevar o percentual do produtor nacional investido no setor.
A falta de clareza não se resume à indefinição de uma meta quantitativa – com a exceção do PPR de Esperidião Amin, que crava US$ 1,5 bilhão ao ano, sem explicar muito bem por quê.
Com efeito, chega a soar ridículo o percentual reinvestido na área, em comparação com outros países. Para piorar as coisas, estes ainda têm PNBs várias vezes maiores que o brasileiro. O resultado é que o país acaba dedicando a ciência e tecnologia mais ou menos o mesmo que a IBM norte-americana.
Poucos aparecem dispostos, no entanto a pôr o dedo em uma outra ferida: não basta aumentar o investimento na área, é preciso aumentar sua eficiência. "Com o mesmo dinheiro se poderia fazer muito mais", diz Candotti.
Ele tem em mente os muitos regulamentos que engessam os institutos de pesquisa, impedidos de contratar pesquisadores de alto nível. Como resultado, estima-se, até 50% do pessoal do setor não tem qualquer participação produtiva nas atividades-fim – ou seja, na própria pesquisa.
É difícil de imaginar o PT, por exemplo, mexendo nesse vespeiro. Quércia e Requião anunciam disposição para fazê-lo, ao menos retórica, pois falam em reestruturação dos institutos e fim da política indiscriminada de fomento.

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