São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994
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Dunning inventa detetive alfarrabista

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O escritor John Dunning conseguiu inovar em pelo menos um ponto no romance que introduz o personagem Cliff Janeway. Provavelmente é o primeiro detetive de ficção que coleciona livros raros.
O policial-alfarrabista Janeway é mais um na enorme galeria de detetives com hobby ou profissão exótica que o romance policial anglo-americano produziu. Não chega a ser marcante. Mas "Edições Perigosas" merece ser lido pelo enredo bem trabalhado.
O charme do policial –sua capacidade de atrair leitores bem diferentes entre si, sejam intelectuais ou tipos menos pretensiosos– pode vir de vários fatores.
Um deles é a caracterização do personagem –outro é o realismo da história e sua ambientação– outro ainda é a trama.
Os candidatos a escrever um policial precisam criar um tipo atraente. Sherlock Holmes, de Conan Doyle, era assim, do mesmo modo que o Nero Wolfe de Rex Stout ou o casal Nick e Nora Charles, ou Sam Spade, de Dashiell Hammett.
Mesmo os detetives implausíveis de Agatha Christie podem ter qualidades redentoras. Janeway não tem quase nada do charme de um desses. Tenta ser engraçadinho como o Philip Marlowe de Raymond Chandler, mas acaba lembrando o Ed Mort de Luis Fernando Veríssimo.
Os grandes autores do gênero também recriam lugares, como a especialíssima Califórnia de Chandler e Hammett. A Denver de Dunning poderia ser Carapicuíba que a história seria a mesma. Em compensação, a caracterização do mundo dos que vendem e compram livros raros é perfeita.
A trama é o ponto mais alto do livro. Trata-se de investigar a morte de um alfarrabista pobretão. Haveria algum interesse em sua morte, ou foi um assassinato gratuito?
As pistas surgem de modo natural, são convincentes e o autor não nega informações que permitam ao leitor chegar a conclusões.
Os personagens agem de modo realista e um interlúdio romântico complica a apuração. Mesmo assim o final têm surpresas. John Dunning não chega a Chandler, mas também não é um reles S.S. Van Dine.

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