São Paulo, segunda-feira, 2 de maio de 1994 |
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Tori Amos aceita a perda da esperança
MARCELO REZENDE
Se afirmação parece de alguma forma misógina, na verdade se apóia na própria idéia que Amos faz de si mesma e de seu trabalho. No início de 1991, Tori Amos surgiu com seu primeiro disco "Little Earthquakes". E também com algo que poderia ser chamado de um razoável sucesso, a canção "Silent All These Years". No momento em que mulheres apareciam no cenário da música usando o forte perfume da novidade, Tori era a resposta perfeita ao desconforto que nomes como P.J. Harvey e Courtney Love causavam, com suas perigosas idéias anarquistas. Uma espécie de Peter Gabriel de saias. Uma mulher sensível e atuante. O sonho realizado da líder feminista americana Naomi Wolfe. Alguém capaz de transformar o discurso feminista em algo universal, transbordando o seu próprio território e indo de encontro aos problemas dos homens, animais em extinção e florestas em perigo. "Se existe um tema sobre este álbum é sobre a força interior, seja de mulheres reconhecendo a violência interior ou as pessoas aceitando a perda da esperança. Sobre como ter paixão pela vida sem violência." É com esse enigmático discurso que Amos apresenta o novo disco. Mas de que maneira isso se traduz em música? "Under The Pink" tenta retomar a idéia da música como o mais conceitual dos trabalhos. Começa no mesmo lugar em que alguém como Kate Bush havia parado. Instaura uma espécie de ditadura de seu próprio universo. E tudo se inicia com "Pretty Good Year", a melhor canção deste CD. Um lamento de Amos, que consegue contrabalançar a melancolia criada pela melodia com uma inesperada batida pop, no meio de seu andamento. Todas as outras dez canções habitam esse mesmo território. É estranho que Tory necessite usar um pesado véu de perda e abandono para poder falar de felicidade e esperanças possíveis. Outro exemplo é "Cornflake Girl", a música escolhida para se tornar clip. Mais uma ilustração de seus temas sombrios, apesar de tentar, bravamente, soar como algo mais fácil para os ouvidos. E também para o espírito. Um trabalho menor? Não, mas que necessita de um pouco mais de tempo, até se poder separar com clareza o que há de realmente valoroso, e tudo aquilo que foi vitimado pela própria pretensão de sua autora. Um esforço que pode valer a pena. E muito, quando se descobre o quanto pode haver de sublime, maravilhoso e surpreendente em cada uma dessas imperfeitas canções. De uma maneira que apenas as mulheres conseguem. Disco: "Under The Pink" Cantor: Tori Amos Produção: 1994 Lançamento: Warner Preço: 15 URVs (o CD, em média) Texto Anterior: Elis Regina soa fora de moda em CD Próximo Texto: Quem muito possui mais teme dever Índice |
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