São Paulo, terça-feira, 10 de maio de 1994
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Parlamento é `clube de criminosos reformados'

DO "THE INDEPENDENT"

O novo Parlamento sul-africano poderia ser descrito como um "clube de criminosos reformados". Poucos dos 400 legisladores reunidos na sessão inaugural não foram acusados ou condenados.
O presidente Nelson Mandela passou 27 anos na prisão por conspirar para derrubar o governo. Quase todos os 251 novos deputados de seu partido Congresso Nacional Africano já foram presos, detidos, banidos ou exilados por "promover os objetivos de uma organização terrorista".
O vice-presidente, F.W. de Klerk, nunca foi penalizado pelo poder judiciário.
Mas durante 17 dos 21 anos que passou servindo o governo do Partido Nacional, no Parlamento, foi acusado pela ONU de perpetrar um crime contra a humanidade. A maioria dos 82 deputados do PN carrega a mesma culpa.
Mangosuthu Buthelezi, líder do Inkatha Partido da Liberdade, nunca foi julgado. Mas para muitos sul-africanos negros ele foi um odiado chefe de grupo armado.
Quanto a Constand Viljoen, líder da Frente de Liberdade Africâner, na condição de chefe da Força de Defesa Sul-Africana no início dos anos 80, ele carrega a responsabilidade pelo derramamento de sangue em Angola, Moçambique e na própria África do Sul.
Ontem todos eles se sentaram sob o mesmo teto na sede do Parlamento sul-africano na Cidade do Cabo participando de uma cerimônia de reconciliação.
Ronnie Kasrils, ex-chefe do departamento de informações militares do CNA, que já foi o homem mais procurado no país, também participou.
A cerimônia foi presidida por Michael Corbett, presidente do Supremo Tribunal da África do Sul. Ele leu orações em inglês e africâner, deu posse aos novos deputados e pediu indicações ao cargo de presidente da República.
Albertina Sisulu, mãe de dois novos deputados, Lindiwe e Max, indicou Nelson Mandela. Seu marido Walter, que passou 25 anos preso ao lado de Mandela, assistia a cerimônia da galeria pública.
Ninguém se opôs à indicação de Mandela. "Assim", declarou o presidente do Supremo Tribunal, "declaro o sr. Nelson Rolihlahla Mandela o presidente devidamente eleito da República da África do Sul". A Câmara aplaudiu.
Seguiu-se a eleição da presidente do Parlamento. Winnie Mandela, única criminosa comum eleita ao Parlamento, foi ao microfone fazer um discurso de nomeação. Seu ex-marido lhe deu as costas.
A indicada foi Frene Ginwala, de origem indiana e ex-representante do CNA em Londres.
A ação se deslocou para a escadaria do edifício. O presidente Mandela, ao lado do vice De Klerk, ficou de pé com a mão direita sobre o coração, contemplando a paisagem da montanha Table.
A banda da Força de Defesa Sul-Africana, sob a regência de um maestro branco, tocou o hino da libertação, "Nkosi Sikelelí Afrika".
Walter Sisulu, o "avô" e a "consciência" do CNA, desceu a escadaria e disse: "Este é o momento mais grandioso de nossas vidas".

Tradução de Clara Allain

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