São Paulo, quinta-feira, 12 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo forte controla dia-a-dia do cidadão

AURELIANO BIANCARELLI
DO ENVIADO ESPECIAL A CINGAPURA

Pelas ruas limpas e arborizadas de Cingapura não se notam cartazes oficiais nem a presença ostensiva da polícia. Mas a mão forte do governo está no ar.
É possível percebê-la no gesto do motorista de táxi que aponta o cinto de segurança e no embaraço do adolescente que se esquiva de comentários sobre o país.
Não se vêem placas alertando, mas todo mundo sabe: jogar papel no chão, atravessar fora da faixa de pedestres ou deixar de dar a descarga em banheiro público podem custar multas superiores a US$ 500 (CR$ 684,5 mil).
Rabiscar o elevador ou o telefone público, coisa de adolescente, está no rol dos crimes punidos com prisão e chibatadas.
Vale lembrar que policiais à paisana são em maior número que os guardas uniformizados, ou seja, podem estar onde menos se espera.
A rigidez dos costumes e a dureza das punições só beneficiam os turistas. Em Cingapura se pode caminhar pelas ruas à noite sem riscos. Taxistas, policiais, funcionários públicos e vendedores costumam ser solícitos e confiáveis.
A rigidez nos costumes só aumentou desde que chegou ao poder o ex-primeiro-ministro Lee Kuan Yew, 35 anos atrás. Lee continua mandando, através de um regime de fachada parlamentarista, que não abre espaço para a oposição.
O Estado controla quase tudo na vida das pessoas. Nas escolas, os ensinamentos de Confúcio (551-479 a.C.) voltaram a ser pregados. Segundo o filósofo chinês, entidades coletivas como a família e o Estado estão acima de interesses individuais.
Dez anos atrás, o governo incentivou a queda da natalidade. Hoje quer mais filhos, mas apenas nas famílias de maior nível cultural e poder aquisitivo. É uma espécie de "aprimoramento" da raça através do fisco.
A imigração é controlada com rigor. No momento, o país quer médicos especialistas e famílias de Hong Kong que tenham US$ 750 mil (valor aproximado de um triplex de 1.000 m2 em Moema) em reservas; metade do dinheiro ficará "trancado" em conta bancária.
O trânsito e mesmo a idade dos veículos são controlados. Ônibus e carros só circulam pelo centro da cidade com um selo-pedágio de US$ 2 (CR$ 2.738,00) a US$ 3 (CR$ 4.107,00) no pára-brisa.
As "zonas restritas" ao tráfego agilizam o fluxo e engordam os cofres do governo. Nas vias periféricas o trânsito é carregado, mas em avenidas centrais como a Orchard Road o turista pode circular de táxi sem engarrafamentos.
Carros de placas vermelhas só circulam nos fins-de-semana e à noite. Quem optar por elas tem desconto de 33% nas taxas cobradas pelo Estado.
Para se ter um carro é preciso licença especial. Chega a custar 60% do valor do veículo e vale por dez anos. Depois, paga-se nova licença ou joga-se o carro fora. Isso explica porque a frota de Toyotas, Mitsubishis, Mazdas, Subarus e BMWs está sempre nova.
O guia de turismo Foo Say Hin, 56, fala das interferências do governo na vida das pessoas como necessárias e positivas. "É graças a este rigor que estamos crescendo", diz.
Foo tem dois filhos na universidade, ganha o equivalente a US$ 600 (CR$ 821,4 mil) e tem férias de 14 dias. Não possui carro, mas mora em casa própria, como 79% dos cingapurianos.
A maioria das residências é financiada pelo governo em 25 anos. O sucesso desse plano se deve à contribuição compulsória de 23% do salário do trabalhador e de 15,4% por parte do patrão. Em 22 anos, quase 600 mil apartamentos foram construídos no lugar de palafitas.

Conversões pelo dólar-turismo a CR$ 1.369,00.

Texto Anterior: Visita começa pelos bairros chinês e indiano
Próximo Texto: Castigo deixa marcas para toda a vida
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.