São Paulo, sexta-feira, 13 de maio de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Hollywood bebe no `realismo fantástico'

FERNANDA SCALZO
DA REPORTAGEM LOCAL

O sucesso do filme mexicano "Como Água para Chocolate" serviu como inspiração para os roteiristas em crise de Hollywood. A história de Laura Esquivel bateu o recorde de bilheteria de filme estrangeiro nos EUA.
E como Hollywood vive de recordes, dedicou-se a identificar o "segredo" que fez uma produção pobre como "Como Água para Chocolate" arrastar multidões às salas de cinema.
"Como Água" é o chamado "filme para mulherzinhas", ou seja, há um sentimentalismo sem-cerimônia esparramado ao longo da narrativa –fenômeno já identificado com o sucesso de "Tomates Verdes Fritos"'.
Mas para além –além mesmo– da emoção fácil, a produção mexicana tem "fenômenos inexplicáveis".
Esses fenômenos podem ser da ordem da paranormalidade, da magia, do espiritualismo, do charlatanismo e por aí.
Não há dúvida que desde o sucesso estrondoso de "Ghost", Hollywood percebera que existe vida além dos filmes de ação.
Assim como a Rede Globo também identificou esse filão como saída para a crise de suas novelas. À tecnoparanormal "Olho por Olho", seguiu-se "A Viagem", novela espiritualista que já alcançou uma média de 58 pontos do Ibope.
Vai ao encontro desse interesse do público por tudo o que "vai mais além", a superprodução "A Casa dos Espíritos", que estréia hoje em São Paulo.
O romance da chilena Isabel Allende, em que o filme se baseia, encaixa-se no que se chama de "realismo fantástico" ou "realismo mágico" em literatura.
O romance "Cem Anos de Solidão", do colombiano Gabriel García Márquez, é o principal representante desse gênero literário, responsável pelo "boom" da literatura latino-americana na década de 70.
O "realismo fantástico" caracteriza-se pela convivência, na narrativa, de fenômenos mágicos (homem que voa, pessoa que nunca morre, por exemplo) com acontecimentos cotidianos.
No "realismo fantástico", os fenômenos mágicos têm relação direta com a cultura e a tradição dos países latino-americanos de língua espanhola –por isso, o gênero no Brasil nunca produziu grandes romances.
Mas em Hollywood tudo se dilui. Transpostos para a tela, os poderes de Clara, a personagem central de "A Casa dos Espíritos", parecem os de uma charlatã (leia texto ao lado).
Infelizmente para Hollywood, não é a qualidade dos efeitos especiais, que em "Como Água para Chocolate" eram muito pobres, que dá credibilidade à magia.
Nessa onda de "realismo fantástico" segundo Hollywood, a atriz Bridget Fonda prepara-se para filmar a história de uma mágica que viaja pela América Central apresentando seu grande número: faz seu coração sair pela boca.
O filme "Rough Magic" terá direção de Clare Peploe, a senhora Bernardo Bertolucci –o diretor que foi buscar sua poção mágica no Oriente ("O Pequeno Buda").
E o melhor exemplo do liquidificador de tradições, crenças e crendices em que Hollywood pode se transformar, é o fato de a Warner ter comprado os direitos para filmar "O Alquimista", de Paulo Coelho.

LEIA MAIS
sobre as outras estréias de cinema à pág. 5

Texto Anterior: `Castelo' dobra audiência da Cultura
Próximo Texto: Diretor esfria sangue latino
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.