São Paulo, sábado, 14 de maio de 1994
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Negro festeja abolição em hotel 5 estrelas

LUÍS EDUARDO LEAL
DA REPORTAGEM LOCAL

Doze integrantes do Movimento pelas Reparações-Já –grupos negros que defendem o pagamento de indenizações para os descendentes de escravos– lembraram ontem com camarão e champanhe francês os 106 anos da abolição da escravatura (13 de maio de 1888).
O grupo escolheu o restaurante Bela Vista, no hotel Maksoud Plaza, cinco estrelas de São Paulo. Foi uma tentativa de demonstrar que o preconceito racial e a desigualdade persistem.
Alguns integrantes do grupo haviam participado, em novembro de 93, de um protesto no hotel em comemoração ao Dia Nacional da Consciência Negra.
Na ocasião, tentaram sair sem pagar a conta. Segurança e Polícia Militar intervieram, mas o grupo fugiu após impasse sobre quem assumiria a despesa de US$ 700.
Ontem foi diferente. O maître do Maksoud aproximou-se do grupo no hall do hotel. Informou que só poderiam almoçar se pagassem antecipadamente os pratos.
"É um absurdo, uma discriminação. Pretendemos pagar", argumentou Fernando Conceição, 35, do Núcleo de Consciência Negra da USP e coordenador do Movimento pelas Reparações-Já.
Os doze integrantes do grupo esperaram 45 minutos no restaurante até que se resolvesse o impasse com o gerente Carlos Ferraz, que insistia que os pedidos fossem pagos antes de chegar às mesas.
O advogado José Roberto Militão, integrante do grupo, deixou então o hotel para registrar queixa de "discriminação racial" no 5º Distrito Policial (Aclimação).
"É uma exigência descabida. Não exigem o mesmo dos estudantes que vêm aqui dar o `pendura' (tradição de alunos de direito, que fazem refeições sem pagar no dia 11 de agosto)", disse um dos integrantes da mesa, o professor Luiz Carlos Santos.
O grupo finalmente decidiu pagar adiantado os CR$ 437 mil referentes a cervejas, uma garrafa de champanhe francês, frutos do mar e pratos de filé de peixe.
Na mesa ao lado, as amigas Yolanda Giusti Papa, Nina Lentini, Wanda Marcucci Nese e Lile Michelini Africano Fernandes, com idades "entre 60 e 70 anos", tentavam entender o que se passava.
"Acho que deveriam escolher um restaurante mais classe média baixa", sugeriu Yolanda, imaginando que o grupo de negros não tinha dinheiro para pagar a conta.

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