São Paulo, terça-feira, 17 de maio de 1994
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A austeridade será cumprida

RAUL JUNGMANN

RAUL JUNGMANN
No dia 3 de maio, o presidente Itamar Franco enviou ao Congresso Nacional a modificação da proposta orçamentária para 1994, que decorreu da criação do Fundo Social de Emergência pelo Legislativo, com parâmetros diferentes do apresentado pelo Executivo, e do excelente resultado da arrecadação federal nos últimos dois trimestres.
A nova proposta mantém inalterados os objetivos fiscais básicos do plano de estabilização: a geração de um saldo suficiente para pagar os juros reais da dívida federal (superávit primário) e, consequentemente, não aumentar o endividamento público líquido (equilíbrio operacional).
A consistência da proposta está assegurada pela reestimativa da arrecadação pública. Em 1993, segundo a Receita Federal e o Ministéro da Previdência Social, registraram-se crescimentos em dólar de 26% na arrecadação de impostos e contribuições federais e de 20% nas contribuições previdenciárias. Os aumentos resultaram da recuperação do nível de atividade –o Produto Interno Bruto cresceu 5% no ano passado– e, principalmente, da normalização operacional e legal dos instrumentos de cobrança dos encargos fiscais.
Nessas normalização atuaram o fim de contenciosos legais como o da Contribuição de Financiamento da Seguridade Social (Cofins), as antecipações de recolhimento dos impostos, a aplicação da legislação do Imposto de Renda de dezembro de 1992 e, finalmente, o esforço de fiscalização contra a evasão e a sonegação fiscal.
Os resultados do primeiro trimestre de 1994 demonstram que a expansão da receita continua; registrou-se um crescimento de 32% em dólar ou 48% em Ufir nas contribuições e nos impostos arrecadados, em relação ao mesmo período de 1993. Caso descontado o efeito da introdução do IPMF, o recolhimento de janeiro a março supera em 22% a mesma base. A Cofins cresceu 106%, em Ufir, no período. A nova proposta orçamentária para 1994 foi feita já utilizando a trajetória positiva da capacidade de arrecadação de impostos e contribuições.
As contribuições sociais mereceram projeções mais otimistas. Primeiro, porque as alterações decorrentes da negociação do Fundo Social de Emergência ampliaram a base de incidência de algumas contribuições sobre o sistema financeiro. Em segundo lugar, porque a Cofins e o PIS/Pasep apresentam hoje um grau de indexação inferior ao implementado nas demais receitas federais, gerando uma perda real de seu valor pela corrosão inflacionária. Com a introdução do real esta perda será eliminada.
A esperada estabilização dos preços trará importantes alterações nas relações financeiras, impactando negativamente, em especial, o IOF e o IPMF. As estimativas apresentadas na nova revisão orçamentária prevêem perdas na arrecadação destes impostos. Os valores destas perdas serão conhecidos efetivamente com a chegada do real e, caso sejam maiores que os estimados, o compromisso de equilíbrio fiscal do plano de estabilização frustrará a execução de um valor equivalente nas despesas orçadas.
Como não poderia deixar de ser, as estimativas das receitas são consistentes com os objetivos da política econômica e o cenário esperado para a evolução do nível de atividades e dos preços. Por outro lado, esta consistência, inevitavelmente, tem de se refletir nas despesas ao se cumprir normas constitucionais de transferências para Estados e municípios e de vinculação de gastos públicos, especialmente para a Seguridade Social.
O Fundo Social de Emergência conseguiu quebrar parte desta vinculação, ao possibilitar a realocação de 20% de todas as receitas da União. No entanto, mesmo este grau de liberdade não compensa as características do aumento da receita em 1994.
O maior recolhimento das contribuições sociais deve ser gasto em Previdência Social, saúde e em assistência social e/ou transferido para o Fundo de Amparo ao Trabalhador. Não é descontrole de gastos quando se aumentam as despesas com a Seguridade Social, em valor equivalente ao adicional de receitas projetado para estas contribuições. Trata-se de determinação constitucional.
Assim, do aumento de US$ 11,1 bilhões na receita, US$ 3,5 bilhões serão transferidos por determinações constitucionais e legais, resultando um incremento líquido de US$ 7,6 bilhões para os gastos federais. Deste incremento, a Seguridade Social absorverá 68% ou US$ 5,2 bilhões. O adicional de receita livre para a revisão do orçamento foi de US$ 2,4 bilhões, ou menos de 22% do aumento total.
Deve-se destacar que nenhuma dotação adicional foi alocada para despesas de pessoal ou de juros em relação à proposta de dezembro. Portanto, a revisão de maio de 1994, de nenhuma forma, sinaliza excessos de dotações para gastos da União. A austeridade exigida pelo plano de estabilização permanece e será cumprida.

RAUL JUNGMANN, 42, é secretário-executivo do Ministério do Planejamento. Foi secretário de Planejamento do Estado de Pernambuco (1990-91) e diretor-executivo do Instituto de Estudos e Cidadania (Idec) em 1991.

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