São Paulo, quarta-feira, 18 de maio de 1994
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Pesquisa na pesquisa

JANIO DE FREITAS

Pesquisas de opinião pública têm, todas, a gentileza de permitir interpretações tão variadas quantos sejam os seus leitores. A do Datafolha sobre greves, publicada ontem, logo de saída permite interpretá-la como a de maior interesse, até agora, para as eleições. Ou seja, as suas indicações têm um sentido que excedeu o tema e a interpretação divulgada. Já temos aí duas interpretações, portanto. Mas também a avaliação dos percentuais permite leitura diferente da divulgada, segundo a qual "a maioria dos paulistanos acredita que a onda de greves da semana passada tinha objetivos eleitorais". Por outra interpretação, a maioria é dos 51% que, por duas respostas, atribuem as greves aos problemas econômicos dos trabalhadores.
"Os salários, que estão baixos", foram apontados por 32% como causa das greves. "O plano econômico, que piorou a situação dos trabalhadores", foi indicado por 19%. Mas só há um jeito de piorar a situação dos trabalhadores, que é mantendo baixos os seus salários. Logo, as duas perguntas são uma só, com formas diferentes. Daí a interpretação de que a maioria real é de 51% –aliás, maioria absoluta– e atribui às greves causa mais concreta do que a motivação meramente eleitoral que o PSDB, o governo e os serviços de informação lhes atribuíram.
Por falar em maioria real, entra-se na interpretação da outra face da pesquisa, esta, sim, ligada ao tema eleitoral. É consensual que a candidatura de Fernando Henrique depende do plano antiinflação, contando o candidato e seus adeptos que, já no mês seguinte à introdução do real, a queda da inflação produzirá efeitos em benefício dele. É uma possibilidade que ninguém negou até agora. Mas que a pesquisa vem questionar.
Seja diretamente, pela referência aos salários baixos, seja pela menção negativa ao plano econômico, a maioria absoluta mostra-se contrária a condições que a introdução do real não vai mudar: a inflação pode cair, mas os salários não vão melhorar. O mais provável é até que piorem um pouco mais. O que a pesquisa sugere, então, é que a queda dos índices de inflação não representa por si só, como dela esperam os correligionários de Fernando Henrique, um fator de mudanças significativas nas preferências do eleitorado.
É claro que a ressonância da queda da inflação, já esperável dos jornais e TVs, tende a refletir-se no eleitorado em alguma dose. Mas, sendo a opinião majoritária definida por motivações que a queda da inflação não altera automaticamente, é duvidoso que mesmo este benefício parcial acompanhe Fernando Henrique até a eleição.
Os fernandistas podem ficar tranquilos, porém. A pesquisa permite outras interpretações.

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