São Paulo, quarta-feira, 18 de maio de 1994
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Aluguéis e conversão

LUÍS NASSIF

Qualquer plano de gestão empresarial necessita, para seu sucesso, que seja compreendido por todas as instâncias envolvidas no processo. Não adianta a concepção do plano estar apenas na cabeça do diretor.
Por isso mesmo, é imperdoável o que está ocorrendo com o real, desde o seu anúncio. Há duas ou três pessoas dentro da equipe que bolaram e/ou entenderam a concepção do plano e o espírito da conversão de contratos –Pérsio Arida, Gustavo Franco. Só que não cuidaram de explicar essa concepção nem aos próprios membros da equipe.
Nas primeiras semanas após o anúncio do real, o economista Winston Fritsch foi até a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo discorrer sobre o plano, sem entender sua lógica. Espalhou confusão.
Na sequência, o secretário-geral do Ministério da Fazenda, Clóvis Carvalho, o assessor especial, Milton Dallari, o secretário da Receita Federal, Oziris Lopes, deram entrevistas também demonstrando falta de compreensão em relação aos princípios do plano.
Agora, delega-se ao assessor Dallari a tarefa de negociar a conversão dos aluguéis. Dallari é especialista em preços e abastecimento e cumpre bem suas tarefas. Mas não entendendo as concepções do plano para contratos, está virando presa fácil de uma conspiração antiinquilino.
A coluna sempre foi contra os exageros da atual Lei do Inquilinato. Ao manter prazos rígidos de reajustes e contratos de longa duração transformou em pó os aluguéis antigos e em ilusão os novos contratos de locação.
Só que as formas de conversão propostas por este conciliábulo que se reuniu com Dallari desequilibram de tal maneira o jogo em favor dos proprietários que vai acabar elevando o valor real dos aluguéis para níveis inéditos.
Pico do pico
A lógica da conversão é simples. Tem-se uma moeda –o cruzeiro real– que se movimenta a 45% ao mês. Vai-se trocar por outra moeda –o real– que deverá correr em velocidade bem menor. Para que haja neutralidade na conversão de contratos, deve-se levar em conta, primeiro, seu valor médio no último período com a velha moeda. Depois, a presunção de inflação com a nova moeda.
O valor médio significa a média do que foi pago no último período contratual, convertida pela URV do dia do efetivo pagamento. Se o prazo de reajuste for semestral, tomam-se os seis últimos aluguéis, convertidos pela URV do dia do efetivo pagamento, e calcula-se a média.
A primeira proposta apresentada pelos representantes das imobiliárias e endossada pela suposta representante dos inquilinos era pornográfica –para dizer o mínimo. Consistia em converter o valor do aluguel de 1º de julho pela URV de 30 de junho. Depois, prosseguir com os reajustes normalmente (inclusive considerando o resíduo da inflação em cruzeiros) até a data do próximo reajuste.
Significaria em 1º de julho um aluguel 127% maior do que seu valor médio do último período em cruzeiros e 40% maior do que o seu valor de pico! Na primeira data-base em real este aluguel sofreria um novo reajuste, que o elevaria a 172% acima da média do último período em cruzeiros e 68% acima do pico.
Era uma proposta tão absurda que, na segunda-feira, Dallari brecou-a, mas aceitando uma proposta sobressalente também injustificável.
Pela proposta –também endossada pelo suposto representante dos inquilinos– os aluguéis serão convertidos pelo pico do último período em cruzeiro real.
Significa o seguinte: se nos 12 primeiros meses do real a inflação for de 20%, o inquilino pagará 60% a mais do que pagava em cruzeiros reais. Mesmo no caso da inflação do primeiro ano do real ficar em 100%, ainda assim o inquilino estará pagando 26% a mais. Um absurdo.
Perdas dos proprietários
Se não quiser penalizar nenhum lado, a equipe econômica deveria levar em conta, no máximo, os seguintes pressupostos:
1) Se a inflação pós-real for de 20% ao ano, o aluguel deveria ser convertido em real por no máximo 9% acima da média do último período, para conservar o mesmo valor.
2) No caso da inflação pós-real ficar em 40% ao ano, o aluguel deveria ser convertido por 18% acima da média.
André Lara
Por sua seriedade, o economista André Lara Rezende é uma das poucas exceções, dentre os economistas do governo provenientes da universidade. Desde o primeiro nmomento, foi o único membro da equipe a colocar as responsabilidades perante o país acima de vaidades, interesses pessoais e eleitorais.

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